Marina acena ao mercado e promete autonomia para o BC
Maria Alice Setubal, a Neca, coordenadora do programa de governo de Marina Silva, afirma que a candidata a presidente pelo PSB reafirmar� os compromissos feitos anteriormente por Eduardo Campos (morto no �ltimo dia 13) a respeito de conceder autonomia formal, por lei, ao Banco Central.
http://www3.uol.com.br/module/playlist-videos/2014/neca-setubal-no-poder-e-politica-1408673905097.js
Em entrevista � Folha e ao UOL, Neca disse que ao longo da campanha mais economistas "estar�o se aproximando" e ter�o mais o perfil de "operadores" do mercado, para compensar a caracter�stica mais acad�mica da maioria dos atuais conselheiros de Marina nessa �rea -papel no momento de Eduardo Giannetti e Andr� Lara Resende, entre outros.
Essa � uma tentativa de Marina se qualificar como uma candidata confi�vel aos olhos do establishment financeiro e empresarial. O programa de governo da campanha presidencial do PSB deve ser lan�ado no pr�ximo dia 29. A candidata tamb�m estuda fazer um discurso ou um documento mais sucinto a respeito de seus compromissos na �rea econ�mica.
Na entrevista, Neca disse que a meta de infla��o anual num eventual governo Marina Silva permanecer� em 4,5%, mas ser� perseguida uma pol�tica que permita fixar o percentual em 3% a partir de 2019.
Neca tem 63 anos e � uma das acionistas do Banco Ita�. Tornou-se amiga de Marina Silva desde a campanha de 2010. Com que frequ�ncia conversam? "Quase todo dia. A gente se fala por telefone bastante".
A partir da consolida��o de Marina como candidata a presidente, revela Neca, cresceram as ofertas de doa��es. "Acho que � o pragmatismo, saiu a primeira pesquisa...", filosofa.
Sobre o risco de paralisia pol�tica no in�cio de uma eventual administra��o federal marinista, por causa do pouco apoio no Congresso, a avalia��o da coordenadora do programa de governo � que "o PSB � um partido que n�o � t�o pequeno assim". E haver� alian�as. Cita alguns acertos eleitorais neste ano nos Estados "j� com o PMDB". E fala que Marina "tem certeza que muitas pessoas do PSDB e do PT v�o estar fazendo parte do governo, no Executivo".
Ao analisar o que considera erros do governo Dilma, faz a seguinte avalia��o: "Ela tem uma incapacidade de ouvir. Desagrega. Acho que a Dilma reproduz uma lideran�a masculina. � aquela pessoa dura, que bate na mesa, que briga, que fala que 'eu vou fazer, eu vou acontecer, eu sei'. Isso �, no estere�tipo, uma lideran�a muito mais patriarcal do masculino, do coronelismo brasileiro".
A seguir, trechos da entrevista:
*
Folha/UOL - Como foi a semana depois da morte de Eduardo Campos at� a escolha formal de Marina Silva como candidata a presidente?
Neca Setubal - Foi uma das semanas mais intensas que vivi em toda a minha vida.
A conviv�ncia com o Eduardo [Campos] durante todo esse tempo tinha sido muito intensa. N�s aprendemos a gostar muito do Eduardo, a respeitar, a admirar.
Tem v�rios depoimentos de pessoas que tinham se afastado e que aos poucos, vendo o Eduardo, convivendo com o Eduardo, come�aram a voltar a ficar mais pr�ximos.
A Marina ficou completamente derrubada nesse momento [da morte], pela rela��o que ela tinha constru�do com o Eduardo. Apesar de toda a imprensa relatar muitas intrigas, para as pessoas que me perguntavam eu sempre falava: "Acho que tem diferen�a, especialmente das equipes locais, mas ela e o Eduardo t�m uma sintonia impressionante". Era incr�vel a sintonia dos dois. Havia complementaridade, respeito e admira��o.
Foi um impacto muito grande. Nos dois, tr�s primeiros dias, houve uma imobiliza��o, realmente, de luto.
Na quarta-feira [20.ago.2014], houve alguns momentos de tens�o entre os grupos do PSB e da Rede?
Talvez tenha havido tens�o interna no PSB, mas de grupos. Eu n�o sou t�o ligada �s quest�es partid�rias, n�o acompanho isso. N�o sei dizer [se houve tens�o]. Da Rede, nenhuma. Nenhuma no sentido de que n�s nos recolhemos. Obviamente, a gente achava que isso [Marina ser candidata a presidente] iria acontecer. Ela n�o teria como n�o ser. A gente tamb�m acreditava que o PSB n�o tinha como n�o lan��-la como candidata.
E no plano dos assessores? Houve a nomea��o de Walter Feldman como coordenador. Antes, era Carlos Siqueira. A� houve tens�o?
O Carlos Siqueira � muito ligado ao Eduardo. Acho que desde sempre ele j� era ligado ao Miguel Arraes. Ele est� muito sensibilizado ainda. Como todos. Houve um certo desentendimento dele em rela��o ao desejo da Marina t�-lo como coordenador. A Marina sempre teve uma rela��o muito pr�xima ao Carlos Siqueira. A mudan�a para o Walter Feldman � porque agora, como a campanha tem um novo CNPJ, a coordena��o financeira precisa estar ligada com a Marina, porque ela ser� a respons�vel -junto ao PSB, logicamente.
A partir de agora, a regra para receber doa��es ter� as restri��es impostas pela Rede, que rejeita dinheiro de algumas empresas, como a do setor de fumo, por exemplo?
Isso ainda n�o foi discutido. Acredito que em 2010 a Marina n�o recebeu doa��es da ind�stria do tabaco e de armas. Obviamente, com Eduardo teve outra conota��o. A campanha j� [doa��es] recebeu de [empresa de] bebida alco�lica. N�o sei se de agrot�xico, talvez tenha alguma restri��o. Mas eu n�o sei. Eu acredito que n�o ter� de bebida alco�lica.
No caso de tabaco, se houve alguma doa��o como � que ser� tratado?
Bom, a� j� foi. Agora vai zerar tudo e vai come�ar de novo. � outro CNPJ.
Como fica o programa de governo preparado em conjunto por voc�, pela Rede, e por Maur�cio Rands, pelo PSB? Temas como legaliza��o do aborto e descriminaliza��o da maconha estar�o mencionados?
O programa n�o entra em nenhum desses dois temas.
Temos um t�pico sobre pol�tica de drogas, de "drogadi��o", dentro da �rea de sa�de. Acreditamos que n�o seja um tema de seguran�a, mas de sa�de, e est� dentro dessa �rea mais em termos de preven��o, de recupera��o. N�o entramos na quest�o da descriminaliza��o da maconha, nem a favor nem contra.
Em rela��o ao aborto, temos no programa um eixo que trata das quest�es de cidadania e identidades. O foco desse eixo � a quest�o dos direitos humanos. Vamos tratar todas essas quest�es relativas �s mulheres, relativas � sa�de LGBT, em termos de direitos humanos, mas tamb�m n�o vamos entrar especificamente nessa quest�o. Ningu�m � a favor do aborto, mas a favor de dar suporte �s mulheres nessas situa��es.
E tanto a Marina quanto o Eduardo j� haviam se pronunciado sobre isso.
Legaliza��o do aborto n�o � uma quest�o mencionada?
N�o, n�o � mencionada. N�o mencionamos esse termo. Mas est� tratada em todas as quest�es que envolvem mulheres e apoio �s mulheres e contra a viol�ncia.
Haver� men��o a mulheres que por eventualidade tenham praticado aborto e t�m que receber apoio do Estado para um tratamento?
Acho que isso sim. Isso sim. Est� mencionado. Nesse caso, o SUS deve atender as mulheres.
E para drogas o foco � no tratamento daqueles que s�o dependentes?
No tratamento e na preven��o. Exatamente.
A sua posi��o pessoal sobre esses dois temas � mais liberal do que era a de Eduardo e do que � de Marina?
Em rela��o ao aborto, sou a favor. Acho que � um direito das mulheres. Acho que isso deveria ser liberado.
Em rela��o �s drogas, n�o tenho uma posi��o. Acho muito complexo.
Eduardo Campos falou v�rias vezes que a meta de infla��o seria perseguir 4,5% nos pr�ximos quatro anos para assumir uma meta, de 3%, a partir de 2019. Isso vai estar explicitado no programa?
Vai.
Dessa forma?
Dessa forma. Exatamente. A meta de infla��o vai para o centro, para 4,5%, ao longo do governo de quatro anos. Para depois chegar a 3%. Isso est� expl�cito.
Economistas ortodoxos e alguns do governo dizem que para reduzir a infla��o ao longo de quatro anos nesse n�vel seria necess�rio aumentar juros e produzir desemprego no pa�s. Esse tema � tratado no programa?
N�o dessa forma, n�o vai dizer. Acho que n�o existe "vou aumentar juros". Nenhum programa vai colocar dessa forma.
O cap�tulo de economia tem um olhar que combina com uma parte da gest�o de recursos naturais. Busca-se um di�logo com o desenvolvimento sustent�vel.
O Eduardo [Campos] tinha um compromisso com o social. Ao mesmo tempo que enfatizava a gest�o, nunca perdia de vista o compromisso com a quest�o social. Ele dizia que conseguiria compor: trazer a infla��o [para o centro da meta] e ter responsabilidade fiscal. No programa de governo tem o que ele falou. Ele j� havia falado de ter um conselho de fiscaliza��o.
Marina, como o programa j� est� pronto, concordava com todos esses pontos e vai assumi-los?
Vai assumi-los. Vai assumir todos os programas. Ela tinha se posicionado em alguns pontos de uma forma diferente do Eduardo. Por exemplo, o caso do Banco Central. Ela achava que n�o era necess�rio ter uma autonomia formal do Banco Central. Ela n�o achava que precisaria...
De uma lei...
...De uma lei para dar mais autonomia. Mas acho que s�o os consensos. Existiam diferen�as e o programa reflete o que � de consenso. Ent�o ela, enfim, aceitou isso.
No caso do Banco Central, como Eduardo propunha autonomia, mandatos para o presidente e diretores, isso tudo est� mantido e ser� assumido por Marina?
Ser� assumido pela Marina. A declara��o dela � que vai assumir todos os compromissos do Eduardo.
No caso do Banco Central, uma lei seria proposta?
Muitas vezes, Marina falava: "Bom, isso n�o era a minha posi��o, mas essa foi a posi��o do Eduardo e a gente concordou com isso". Ent�o, ela vai assumir essas posi��es.
A autonomia do Banco Central?
�.
H� no programa alguma explica��o objetiva sobre como fazer para que a infla��o recue para o centro da meta de 4,5% ao ano?
Nesse detalhe, n�o. Mas o programa foca pontos muito claros.
Destaca metas da infla��o, o trip� [macroecon�mico]. Destaca muito fortemente a reforma tribut�ria, a responsabilidade fiscal muito grande da qual o Eduardo falava. Marina manter� isso. Nos primeiros meses [de governo], Eduardo falava, entregaria ao Congresso uma proposta de reforma [tribut�ria] que se daria ao longo do governo dele. Isso ser� mantido, est� no programa de governo.
Mas como ser� poss�vel baixar a infla��o, manter os programas sociais, ampliando at� alguns programas e ter responsabilidade fiscal?
A gente tem sempre que se reportar ao Eduardo, principalmente nesses temas macroecon�micos. A hist�ria dele � de muita coragem. Arriscava. Ele trazia para as pessoas o resultado dele em Pernambuco. Claro, Pernambuco � um Estado pequeno, obviamente. Mas em Pernambuco ele conseguiu virar a hist�ria, em termos de desenvolvimento econ�mico.
O que ele havia passado a falar ultimamente � que todo mundo perguntava de onde iria tirar os recursos para a educa��o integral de ensino m�dio, para o passe livre -que custa R$ 12 bilh�es por ano-, o ensino integral custa R$ 20 bilh�es. Ele falava: "Ent�o, e os R$ 50 bilh�es da energia por causa do rombo que aconteceu? E quando a taxa Selic aumenta 0,5 ponto percentual, que significa R$ 15 bilh�es na d�vida?".
Essa era a fala dele. N�o sei como a Marina vai construir essa narrativa.
H� em geral uma d�vida no establishment a respeito de Marina. Eduardo Campos foi governador de um Estado por oito anos. Tinha experi�ncia administrativa. Marina Silva n�o tem. Como ela responder� a essa cr�tica?
Acho que � muito relativo. Hoje, temos uma presidente cujo perfil � de gest�o, pragm�tico, racional. Talvez o oposto da Marina. E o resultado que n�s temos � bastante insatisfat�rio. Toda essa fala da Dilma gestora se desfez ao longo de quatro anos.
Mesmo os n�meros de entrega do PAC s�o muito abaixo [do esperado].
Fernando Henrique tinha pouca refer�ncia de gest�o. O Lula acho que nenhuma, menos ainda que Marina -que foi por quase oito anos, sete anos, ministra do Meio Ambiente, al�m de senadora.
Eu entendo que o mercado se preocupe. A� a complementaridade Eduardo e Marina era uma coisa muito bacana, muito boa. Mas isso para mim, realmente, n�o � um problema. Por que n�o � um problema? Pelos exemplos que eu dei anteriores, e porque acho que a principal qualidade do presidente da Rep�blica � lideran�a, � ter uma vis�o pol�tica. No Brasil n�o faltam t�cnicos bons. A quest�o � ter um olhar t�cnico com uma vis�o pol�tica.
Tem que ser competente, l�gico. Mas tem que ter uma vis�o pol�tica e tem que ter uma vis�o, uma lideran�a. Escolher as pessoas certas. E a� a Marina, diferentemente do Eduardo, cada um com seu estilo, a Marina � uma pessoa que trabalha em equipe. O Eduardo era uma pessoa muito mais centralizadora. A Marina � uma pessoa de equipe.
Vai ser necess�rio que no lan�amento do programa de governo Marina fa�a uma s�ntese de compromissos na �rea macroecon�mica?
Talvez. Vamos come�ar a trabalhar amanh� [22.ago.2014], o Maur�cio [Rands] e eu, sobre como vamos fazer o lan�amento.
Est� segura de que Marina vai assumir todos os compromissos expressados por Eduardo?
Vai, certeza. O mercado visualizando as pessoas que est�o ao lado dela vai ter muito mais seguran�a. Ela j� tem v�rios economistas. Ter� outras, mais operadoras. Tem [Eduardo] Giannetti, Andr� Lara Rezende, Eliana Cardoso, Jos� Eli da Veiga. S�o economistas que t�m um olhar mais acad�mico. Eles j� d�o um certo aval para o mercado -embora eu entenda que n�o seja suficiente porque eles s�o mais te�ricos. Acredito que ao longo da campanha n�s vamos ter outras pessoas que estar�o se aproximando, que s�o mais, vamos dizer, operadores.
E ela pr�pria, a candidata Marina Silva, fazendo uma declara��o mais espec�fica sobre economia?
Isso sem d�vida.
Eduardo Campos defendia o fim da reelei��o, mandatos de 5 anos coincidentes para todos os cargos executivos e legislativos. Isso est� no programa?
Est�. Explicitamente desta forma. Marina � contra a reelei��o completamente.
Hoje, o Brasil tem elei��o a cada dois anos. Nesse formato proposto, haver� s� uma vez a cada cinco. Marina tem opini�o a respeito desse aspecto da mudan�a?
Acho que n�o � por a�. Por qu�?
A Marina personifica muito a nova pol�tica. A nova pol�tica que est� em constru��o traz embutida uma maior participa��o da sociedade, ao longo dos anos. A elei��o � um aspecto, claro. Talvez o mais importante. Mas est� impl�cito que ao longo dos anos os cidad�os teriam muito mais possibilidade de participa��o, participa��o virtual, vindo de diferentes ferramentas que existem hoje.
Isso est� no programa?
Est�.
De que forma ser� essa participa��o ao longo do mandato de uma eventual presidente Marina Silva?
Inova��o na democracia digital. Plebiscitos. Referendos.
Esta nova forma de participa��o que os jovens est�o fazendo, todos esses v�rios aplicativos. Trabalhar com transpar�ncia nas contas p�blicas, acompanhando.
Eu sei que parece muito idealismo, "imagina romper com isso...".
Tem alguma ferramenta descrita, objetivamente, sobre a maior participa��o popular?
Como seria alguma ferramenta n�o tem. Mas existe uma discuss�o, uma an�lise sobre isso.
Seria mais desej�vel ter mais plebiscito, referendo?
Isso est� explicitado.
� mais democracia direta...
Mas com respeito aos partidos. N�o � uma posi��o alternativa ao sistema pol�tico.
Mas esse sistema pol�tico, no mundo, foi cunhado no s�culo 19. N�o d�, realmente, conta. N�s estamos em uma transi��o. N�o est� claro como ser� a nova forma de participa��o, mas � um momento no mundo de discuss�o desse sistema.
Uma das d�vidas a respeito da eventual elei��o de Marina Silva � como ela lidar� com o Congresso Nacional. Haver� um impasse?
N�s acreditamos que � poss�vel fazer diferente e que tem que ser feito diferente e que isso n�o vai ser feito do dia para a noite.
Mas em um primeiro momento? Para n�o haver uma paralisia.
Teve o Itamar Franco [1930-2011; presidente de 1992 a 1995], que tamb�m teve problemas. Primeiramente, o PSB � um partido que n�o � t�o pequeno assim. Voc� tem as alian�as. Algumas alian�as j� com o PMDB. A Marina aposta nisso que o Eduardo tamb�m apostava. Ela tem certeza que as pessoas, que muitas pessoas do PSDB e do PT v�o estar fazendo parte do governo, no Executivo.
Agora, na C�mara acho que vai precisar muito di�logo mesmo. A� uma pessoa como o Beto [Albuquerque] vai ser fundamental.
Beto Albuquerque?
Beto Albuquerque. Uma pessoa do di�logo, uma pessoa que sabe transitar nas diferen�as, nos diferentes partidos, uma pessoa como Walter Feldman, que tem tamb�m experi�ncia na C�mara.
S� que dentro do Congresso tudo funciona muito na base das alian�as formais...
E das bancadas espec�ficas.
Exato. Digamos que a bancada do PMDB aceite apoiar o governo mas pe�a o Minist�rio dos Transportes. Esse tipo de negocia��o � vi�vel num governo Marina Silva?
Acho que n�o dessa forma.
Seria como?
Acho que a Marina vai negociar e discutir em termos de programa. Se o partido se comprometer com o programa de governo, acho que a discuss�o vai ser dentro dessa linha.
O partido teria de dizer "eu concordo com o programa da presidente Marina Silva" e da� participa do governo?
Acho que vai ter discutir. Dando um exemplo, no caso dos Transportes, vai ter que entrar na proposta de transporte. Como que o partido vai se colocar em rela��o a isso? Tenho certeza que ser� assim. Certeza.
Claro que isso n�o vai mudar do dia para a noite. N�o � poss�vel. Mas a Dilma hoje tem uma coliga��o enorme. Tem 12 minutos na televis�o e n�o consegue aprovar muitos dos projetos de lei que ela quer aprovar.
Acho que � poss�vel uma nova forma de acordo. Claro que tem que ter acordos. Faz parte da pol�tica. A Marina � uma pol�tica antes de qualquer outra coisa. Marina � uma pessoa pol�tica. Todo o olhar dela -eu vejo isso muito porque eu n�o sou. N�o venho dessa �rea. Para mim � muito claro enxerg�-la dessa forma. Toda decis�o dela, as falas dela, tudo isso � dentro de uma vis�o do pol�tico. E quando ela insistiu na cria��o da Rede � porque ela acredita na reforma pol�tica como a primeira reforma. Ela acredita que � por a�: se n�o passar pelo pol�tico n�s n�o vamos mudar.
Mas muitos acreditam que o in�cio de um eventual governo Marina Silva ter� uma certa paralisia no pa�s. Esse risco existe?
Acho que n�o. Estamos vivendo um momento hist�rico brasileiro, absolutamente in�dito.
Ontem [20.ago.2014], Marina falou uma coisa que me fez sentido. Toda a homenagem feita pela sociedade e a como��o com a morte do Eduardo, embora a maioria das pessoas nem o conhecessem, foi uma demonstra��o de que as pessoas t�m um respeito pela pol�tica. N�o � que ningu�m quer saber de pol�tica e que pol�tica n�o faz parte da vida. Mas que quando se apresenta uma lideran�a pol�tica, essa lideran�a pol�tica � homenageada.
Estou querendo dizer que acredito que isso tudo que aconteceu, com a morte do Eduardo, que n�s estamos respondendo �s manifesta��es de 2013.
A governabilidade vai existir como existiu ato cont�nuo depois do movimento [de junho de 2013]. Votou-se e se aprovou sei l� quantas medidas que estavam engavetadas, em uma forma de press�o.
� l�gico que depois vai depender da capacidade da Marina, caso eleita, e de sua equipe.
Quais foram os principais erros do governo Dilma Rousseff?
Quando a Dilma assumiu, fiquei com uma esperan�a. Achei aquela posse uma coisa digna. As primeiras falas. Nos primeiros meses eu tinha mudado a minha percep��o em rela��o a ela, achando que ela ia acontecer.
Ao longo do tempo, no meu entendimento, o principal problema do governo Dilma � a quest�o pol�tica. Acho que ela tem uma incapacidade de ouvir. Tem um discurso absolutamente racional, de uma gerente, gestora.
� bom ser gestora, mas gestora tem que ter lideran�a. Acho que ela n�o tem essa capacidade pol�tica, de ouvir e de agregar as pessoas. Ela desagrega. Essa centraliza��o e falta de vis�o pol�tica, no meu entendimento, fazem com que ela queira estar em todos os minist�rios. � imposs�vel ela conseguir gerir todos os minist�rios. Fica fazendo coisas err�ticas e sem planejamento. Acho que s�o essas as principais dificuldades. Incapacidade pol�tica, uma incapacidade de ouvir.
E de liderar, seria isso?
E de liderar, exatamente.
H� uma declara��o sua dizendo que Dilma reproduz um modelo masculino dentro do governo. O que � isso exatamente?
O s�culo 21 � o s�culo do novo. Est� nos colocando o desafio de construir uma nova sociedade. A constru��o de uma nova sociedade � um olhar muito mais feminino. A mulher � que d� � luz. Esse olhar feminino tem que ser diferente, n�o � o mesmo olhar do masculino. Tem que saber equilibrar o masculino e o feminino. Todos n�s temos o masculino e o feminino.
� uma vis�o e uma a��o. N�o � s� o olhar, mas � uma atua��o. Voc� tem que saber ouvir, saber acolher, saber ser criativo, saber lidar com os diferentes, e com o inusitado. E saber acompanhar. E ao mesmo tempo tem que ter muita firmeza. N�o � uma coisa mole, chorosa. Muita firmeza, muita determina��o. Tem que ter esse equil�brio.
Acho que a Dilma reproduz uma lideran�a masculina. Claro que tudo isso � radical, �bvio. Um bom l�der tem que ter sempre os dois mecanismos. A Dilma � aquela pessoa dura, que bate na mesa, que briga, que fala que "eu vou fazer, eu vou acontecer, eu sei". Isso �, no estere�tipo, uma lideran�a muito mais patriarcal do masculino, do coronelismo brasileiro, do pol�tico tradicional que vai resolver tudo sozinho.
As atitudes e a forma de governar da presidente evocariam uma forma de governo antiga?
� isso.
H� uma cr�tica recorrente sobre a cria��o da Rede Sustentabilidade: se Marina Silva foi incapaz de fundar um novo partido, porque deixou para fazer muito em cima da hora, como conseguir� governar o pa�s?
Um ponto que eu acho que foi verdadeiro que foi muito em cima da hora. Foi, assim, no tempo limite.
Exato.
Isso � um ponto realmente. E por que n�o foi antes? N�o foi antes porque a Marina n�o queria sair do PV e entrar em um outro partido sem saber qual era aquela base. Ela sempre falava: "Eu n�o posso pular no escuro, n�s temos uma base para criar um novo partido?".
Porque voc� tinha uma base do PV que n�o se confirmou. Era ent�o preciso construir essa base.
Precisava se consolidar uma base que tornasse poss�vel a cria��o do partido. Outros partidos que n�o t�m base nenhuma, zero, foram criados na base burocr�tica. N�o era o que a Marina queria.
Marina queria criar um partido org�nico. � um partido org�nico porque tem diret�rios em todo o pa�s, tem uma milit�ncia, mas n�o se concretizou na quest�o burocr�tica que os outros concretizaram.
Com a Marina candidata a presidente, como vai ser a arrecada��o de fundos para a campanha? Vai ser melhor ou pior do que estava sendo com Eduardo Campos?
Vai ser melhor, com certeza.
Por qu�?
Porque a gente j� est� vendo isso. Porque eu fiquei at� chocada, para dizer bem a verdade.
Mas por qu�?
N�o sei. Mas o que eu quero dizer � assim... Acho que � o pragmatismo, saiu a primeira pesquisa...
Pelo fato de ela ser mais competitiva, pelo menos nesse momento do que estava sendo Eduardo?
Sim, pela pesquisa, s� por isso.
Houve um aumento...
A procura.
De poss�veis doadores?
Isso. Agora, v�rias pessoas da Rede receberam telefonemas de pessoas, empresas, que est�o interessadas em fazer doa��o.
Se Marina Silva vier a ser eleita a presidente da Rep�blica voc� gostaria de ajudar participando do governo? Com um cargo?
A gente nunca discutiu cargo. Ainda mais com a Marina. Mas eu certamente estarei ao lado dela. N�o sei como, mas certamente estarei.
E se ela te convidar para participar em algum cargo, voc� estaria � disposi��o de ajud�-la?
Estaria � disposi��o.
A sua fam�lia, a fam�lia Setubal, � acionista do Banco Ita�. O Ita� tem rela��es com o governo. Teve uma autua��o da Receita Federal e recebeu uma multa de um valor alt�ssimo, quase R$ 19 bilh�es. Se voc� vier participar do governo, haveria conflito de interesses?
Acredito que n�o porque eu sou acionista do Banco Ita�. Logicamente, fa�o parte da fam�lia, mas eu nunca ocupei nenhum cargo no banco nem no Ita� Social. Nunca participei. Participo do Conselho Consultivo que n�o � nem deliberativo.
Outro dia eu estava com meus irm�os e a gente estava conversando. O Brasil foi outro Brasil. Pensar que meu pai [Olavo Set�bal, 1923-2008] foi convidado a ser presidente do Banco Central, ele n�o aceitou, na �poca do [governo] Jo�o Figueiredo [1918-1999]. Imagine que conflito de interesse seria. Mas se passava naquela �poca. Ditadura. E outra coisa: o Jos� Carlos Moraes de Abreu, que era presidente do banco, participava do Conselho Monet�rio Nacional [risos]. Outro mundo, n�? Outro mundo. Isso que era conflito de interesse real.
O Banco Ita� vai contribuir com as campanhas neste ano?
N�o sei. Imagino que j� tenha at� contribu�do, mas n�o tenho certeza.
Na conversa com os seus irm�os esse assunto n�o surge?
� porque o banco, como todos os demais bancos, contribui com todos os candidatos.
O Supremo Tribunal Federal est� para concluir um julgamento que vai resultar no veto a doa��es de empresas para partidos e para pol�ticos. � uma boa provid�ncia?
Na minha opini�o, devia ter um teto. Um teto para pessoa jur�dica. Um teto, j� tem, mas � alt�ssimo, de 2%, sei l�, do faturamento. Devia ter um teto muito mais baixo.
Como � sua rela��o hoje com Marina?
� muito pr�xima. Acho que desde 2010 a gente construiu uma rela��o muito pr�xima.
Falam por telefone? Com que frequ�ncia?
Ah sim, quase todo dia. Quase todo dia. A gente se fala por telefone bastante.
Voc�s n�o se conhecem h� muitos anos?
N�o, desde s� de 2010, 2009. Sou muito ligada a Oded Grajew, Guilherme Leal. Guilherme eu conhe�o desde a adolesc�ncia. Foi a partir da� que participei do movimento Brasil Sustent�vel, que lan�ou a Marina.
E foi uma rela��o que a gente teve uma identidade muito forte, as duas, com as vidas opostas. Acho que a Marina tem essa capacidade, embora todo mundo fale que ela seja intransigente, que ela n�o tem di�logo. Mas ela � a pessoa que eu conhe�o que tem essa capacidade de conversar com o Roberto [Setubal], meu irm�o, e com outros e todo mundo.
Acesse a transcri��o completa da entrevista
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RAIO-X - NECA SETUBAL
IDADE
63 anos
ORIGEM
Filha de Olavo Setubal (1923-2008), um dos principais acionistas do banco Ita�
FORMA��O
Ci�ncias sociais, pela USP
CARGO
Pela Rede, coordenadora do programa de governo da campanha presidencial de Marina Silva
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A seguir, os v�deos da entrevista (rodam em smartphones e tablets, com op��o de assistir em HD):
1) Principais trechos da entrevista com Neca Setubal (10:50)
2) Marina dar� autonomia ao BC e chamar� operadores do mercado (2:42)
3) Com Marina, crescem doa��es para campanha, diz Neca Setubal (1:02)
4) Muitos do PT e do PSDB estar�o no governo Marina, diz Neca (3:40)
5) Neca: Dilma n�o lidera nem equilibra masculino e feminino (3:24)
6) Nova pol�tica exigir� mais plebiscitos e referendos, diz Neca (3:11)
7) Neca: Aborto � tema de sa�de para Marina, mas n�o ser� liberado (1:14)
8) Marina trabalha em equipe; Eduardo centralizava, diz Neca Setubal (2:11)
9) Se Marina vencer, estarei ao seu lado, diz Neca Setubal (0:33)
10) Ser acionista do Ita� n�o produz conflito de interesses, diz Neca Setubal (1:47)
11) Falo com Marina todo dia, diz Neca Setubal (1:26)
12) Quem � Neca Setubal? (1:48)
13) �ntegra da entrevista com Neca Setubal (72 min.)
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