Aos 70 anos de independ�ncia, �ndia v� crescer risco nacionalista
Baps Akshardham/AFP | ||
Premi� indiano, Narendra Modi (� dir.), faz ritual hindu com l�der espiritual M. Swami Marahaj |
No dia 28 de setembro de 2015, um grupo de hindus munidos de paus e tijolos invadiu a casa do mu�ulmano Muhammad Akhlaq, 50, em um vilarejo no norte da �ndia. Akhlaq levou tijoladas at� morrer, e seu filho Danish, 22, ficou gravemente ferido.
O crime dos Akhlaq: teriam comido carne de vaca, animal considerado sagrado pelo hindu�smo. (A pol�cia determinou depois que a carne que eles guardavam no freezer, e que seria a prova do "crime", era de cordeiro).
Desde que o premi� Narendra Modi e o partido nacionalista hindu BJP assumiram o poder na �ndia, em maio de 2014, 60 pessoas foram alvo de linchamento por supostamente terem comido carne de vaca ou vendido gado para abatedouros, segundo o site de dados IndiaSpend —20 vezes o total de linchamentos por causa de vacas registrado entre 2010 e 2014.
Dessas, 28 morreram. Quase todas eram mu�ulmanas.
Ao completar 70 anos de independ�ncia do Reino Unido, a democracia indiana est� sob amea�a.
Desde a onda de viol�ncia que se seguiu � grande divis�o da �ndia, que deu origem a um Estado hindu e um mu�ulmano, o Paquist�o, gera��es de l�deres reconheceram que a toler�ncia e a secularidade s�o essenciais para governar um pa�s com tamanha diversidade religiosa, lingu�stica, �tnica e cultural.
Com 1,3 bilh�o de habitantes, a �ndia deve superar a China em 2024 como pa�s mais populoso do mundo. Hindus s�o a maioria, 80%, mas h� 172 milh�es de mu�ulmanos (14,2% da popula��o), al�m de crist�os, sikhs, parsis, judeus e outras minorias.
O primeiro-ministro Modi abandonou a agenda para uma �ndia inclusiva: prop�e uma agenda de desenvolvimento econ�mico aliada a medidas que agradam aos nacionalistas hindus.
Modi se formou nas fileiras da Rashtriya Swayamsevak Sangh (RSS, ou Sociedade Patri�tica Nacional), que promove a ideia do Hindutva (Hindusidade) —basicamente, a �ndia para os hindus.
Os nacionalistas da RSS, e de seu bra�o pol�tico, o BJP, querem que o pa�s recupere os anos de gl�ria que precedem os colonizadores brit�nicos e os invasores Mughal (mu�ulmanos). Apostam que a f�rmula Hindutva mais desenvolvimento vai "fazer a �ndia grandiosa de novo".
DISCURSO D�BIO
Mas quando se elegeu em 2014, Modi minimizou suas credenciais hindus e enfatizou a proposta de espalhar pelo pa�s o chamado "milagre de Gujarat", Estado com alta taxa de crescimento, que ele governou de 2001 a 2014.
"O nacionalismo hindu moldou a vis�o de mundo de Modi, mas ele usa a ret�rica do desenvolvimento para atrair a classe m�dia da �ndia, que n�o d� tanta import�ncia � pol�tica identit�ria", disse � Folha Irfan Nooruddin, diretor da Iniciativa �ndia da Universidade Georgetown (Washington, EUA).
No entanto, duas medidas desastradas sabotaram os indicadores econ�micos da gest�o Modi, antes impressionantes. A decis�o "anticorrup��o" de tirar de circula��o notas de 500 e 1.000 r�pias (cerca de 85% das notas em circula��o) causou caos na economia. A implementa��o atabalhoada do novo imposto sobre bens e servi�os foi mais um golpe contra os pequenos empreendedores.
Como consequ�ncia, o crescimento do PIB, que atingiu m�dia de 7,5% entre 2014 e 2017, caiu para 5,7% no segundo trimestre de 2017, em um pa�s que precisa crescer acima de 6% para absorver as 12 milh�es de pessoas entram no mercado de trabalho a cada ano.
E os nacionalistas hindus, sob Modi, ficaram cada vez mais ambiciosos. O BJP est� reescrevendo livros did�ticos em v�rios Estados —prop�e "desocidentalizar" os textos, mas tamb�m est� extirpando minorias, em nome de um orgulho patri�tico hindu.
Em mar�o de 2017, Modi indicou o l�der hindu Yogi Adityanath para governar Uttar Pradesh, Estado com a maior popula��o mu�ulmana da �ndia. Adityanath j� afirmou que, caso um mu�ulmano mate um �nico hindu, cem mu�ulmanos devem ser mortos em retalia��o.
Nem o Taj Mahal escapou de sua f�ria. O mausol�u constru�do pelo imperador mu�ulmano Shah Jahan foi omitido do cat�logo de turismo do Estado e teve seu or�amento cortado. Sangeet Som, integrante do BJP, disse que o Taj Mahal era uma "mancha na cultura Indiana" constru�da por "traidores".
ANTINACIONAL
Os extremistas hindus usam indiscriminadamente o ep�teto "antinacional" para perseguir intelectuais e jornalistas que criticam o nacionalismo ou o BJP. Um dos alvos foi o ganhador do Nobel Amartya Sen.
Outros t�m destino tr�gico. Em setembro deste ano, a jornalista Gauri Lankesh, que comparou o nacionalismo hindu do RSS ao fascismo, foi morta a tiros na frente de sua casa, em Bangalore.
"A democracia indiana enfrenta muitas amea�as, a maior delas � o crescimento do autoritarismo", disse � Folha Sumit Ganguly, coordenador de estudos sobre a civiliza��o indiana na Universidade de Indiana em Bloomington.
"O constante ataque contra a liberdade de express�o � alarmante."
N�o se pode culpar diretamente Modi ou a RSS por essa escalada de viol�ncia contra a minoria mu�ulmana e a oposi��o. Mas a ret�rica inflamada deles promove esse clima de intoler�ncia, aponta Ganguly.
Mesmo assim, analistas apontam que � precoce decretar a morte da resiliente democracia indiana, onde o contradit�rio sobrevive na imprensa e no judici�rio.
Indianos brincam que democracia s� atrapalha, basta ver a rapidez com que as reformas s�o implementadas na ditadura chinesa. Neste caso, o caos democr�tico indiano, com in�meros partidos, n�veis de governo, sociedade civil e imprensa, tem impedido que uma doutrina como o Hindutva prevale�a.
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