Filmar minorias exige saber lidar com repercuss�o, dizem cineastas
Todo diretor pode filmar o que quiser, mas precisa saber lidar com a repercuss�o do que retrata em seu filme junto ao p�blico.
Para os cineastas que compuseram a mesa sobre representatividade no cinema, primeira do �ltimo dia do F�rum Mostra-Folha, artistas podem tratar de temas relacionados a negros e mulheres mesmo sendo homens brancos. Mas o p�blico tem direito de reagir e � necess�rio que se d� espa�o a cineastas que pertencem a minorias.
O debate ocorreu em meio � pol�mica relacionada ao filme "Vazante", de Daniela Thomas, que retrata o Brasil do s�culo 19 e foi criticado por espectadores negros, no Festival de Bras�lia, por seu tratamento da escravid�o.
Glenda Nic�cio, cineasta negra que venceu o pr�mio do p�blico em Bras�lia com seu filme de estreia, "Caf� com Canela", disse que a discuss�o da representatividade cria "desconforto" quando � posta, mas que n�o � uma quest�o de censura.
"Ningu�m est� falando que n�o pode falar, estamos aqui para debater, mas ningu�m passa impune", afirmou. Segundo a diretora, muitos grupos foram sistematicamente alijados de ter o poder da fala na arte e, com isso, imagens deles no cinema e na televis�o seguem estereotipadas.
"Algumas pessoas nunca se viram na tela. Muitos sons ainda n�o foram ouvidos, muitas imagens n�o vistas", disse. "Se a gente tivesse pegado a c�mera antes, ter�amos descolonizado o imagin�rio de forma mais r�pida", apontou, citando express�o usada logo antes por Helena Ignez.
A atriz e cineasta narrou sua experi�ncia como mulher em meio aos diretores do Cinema Novo —segundo ela, um "clube do bolinha" repleto de machismo. Ela disse que seu passo em dire��o ao Cinema Marginal foi devido � falta de liberdade que tinha naquele movimento.
"'O Padre e a Mo�a' [de Joaquim Pedro de Andrade], apesar de bem realizado como of�cio, era uma castra��o da mulher, uma limita��o. Ali, n�o havia protagonismo feminino."
Ignez comentou que tentou denunciar o machismo do Cinema Novo em uma entrevista ao "Pasquim" nos anos 70, mas foi "crucificada". Perguntada se o tratamento discriminat�rio que sentia naquela �poca persiste ainda hoje, foi resoluta: "a misoginia perdeu o charme".
NOVAS VOZES
Luiz Bolognesi, cineasta branco que j� filmou tem�ticas ind�genas e femininas, afirmou que o momento atual � de empoderamento de vozes minorit�rias.
"Esse processo se d� numa disputa de territ�rio com a voz do macho branco, que de certa forma � opressor no cotidiano de todos n�s", disse. "E n�s temos que reconhecer que estamos nesse lugar, dar um passo para tr�s e escutar."
Sobre a pol�mica ao redor de "Vazante", ele afirmou que lhe causa "estranheza" a obra de arte ser tratada com algum grau de viol�ncia e que, dentro de um ambiente democr�tico, todos t�m direito de dizer o que quiserem.
"Mas d� para entender [a rea��o] sob o contexto hist�rico."
"A gente tem que colher as consequ�ncias dos pontos de vistas que colocamos na tela ou da aus�ncia de sensibilidade que temos sobre determinadas quest�es", apontou. "Quando voc� p�e sua narrativa num espa�o p�blico, depois tem que ouvir o que as pessoas t�m a dizer, isso � democr�tico".
Genito Guarani-Kaiowa, cineasta e lideran�a ind�gena, contou sobre sua aproxima��o com o cinema, que tinha como objetivo retratar a realidade de sua comunidade, no Mato Grosso do Sul.
Segundo ele, ap�s grupos de jornalistas e antrop�logos virem � comunidade registrar imagens e hist�rias, seu grupo se deu conta de que o cinema seria uma ferramenta importante para chegar a outros Estados e pa�ses.
Ent�o, conseguiram pela primeira vez trazer equipamento de filmagem para o local.
Ele ressaltou o car�ter coletivo do filme que produziram, "Ava Yvy Vera - A Terra do Povo do Raio". "A comunidade ficou curiosa porque a c�mera ia estar pela primeira vez nas nossas m�os. Todos queriam aparecer no filme.
Chamamos primeiramente nossos rezadores, nossas m�es e pais, professores. Sentamos para cada um repassar sua ideia de qual imagem �amos pegar. Ver o que era mais importante passar para fora."
O debate, que aconteceu no Ita� Cultural na manh� desta sexta (27), foi mediado por Patr�cia Campos Mello, rep�rter especial da Folha. A programa��o continua na tarde desta sexta.
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