'Se algo pode resistir atrav�s da arte, � a complexidade', diz Carlos Nader
Bruno Santos/Folhapress | ||
O cineasta Carlos Nader em mesa do terceiro dia de Flip |
O cineasta brasileiro Carlos Nader e a escritora chilena Diamela Eltit fizeram um elogio da complexidade na arte durante a mesa que dividiram na noite desta sexta-feira (28), na Flip.
"O document�rio pode ser um contraponto ao jornalismo", disse o diretor de filmes como "Homem Comum" (2015) e "Pan-Cinema Permanente" (2008). "O jornalismo muitas vezes � feito a toque de caixa; nessa toada, a complexidade dan�a. Se h� algo que pode resistir atrav�s da arte, � a complexidade. O document�rio � um filme que se relaciona com o mundo, mas que deixa tempo para reflex�o."
Jamais O Fogo Nunca |
Diamela Eltit |
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A autora, que acaba de ter seu romance "Jamais o Fogo Nunca" (Relic�rio) lan�ado em portugu�s, tamb�m se disse partid�ria da exig�ncia formal. "Quando escrevi meu primeiro livro, a cr�tica disse n�o ter entendido nem sequer uma palavra. Me senti culpada."
Mas as ressalvas dos especialistas n�o a desestimularam. "Hoje, me refugio na liberdade que o sistema art�stico oferece e pulo a parte normativa, que se aprende na escola, que ensina a ler desta ou daquela forma. A literatura � uma s�rie de desobedi�ncias. Se n�o fosse assim, seria enfadonha. Busco outros horizontes, sejam eles sociais, liter�rios ou pol�ticos."
A conversa conduzida pelo mediador Jo�o Bandeira, bastante centrada na ideia de que a dupla de entrevistados compartilha uma linguagem "desviante, estranha, resistente" e na recep��o do p�blico a ela, pareceu n�o entusiasmar a plateia. A Igreja Matriz, longe da lota��o m�xima j� no come�o da mesa, foi se esvaziando at� ficar com quase a metade de seus 400 lugares vagos.
Antes disso, durante a apresenta��o dos convidados por Bandeira, um espectador demonstrara impaci�ncia com a extens�o do introito (12 minutos), gritando "chega!" algumas vezes.
O fato � que era dif�cil entender por que a dupla havia sido colocada lado a lado. Os elos estabelecidos entre os processos criativos de Nader e Eltit soavam artificiais, apesar dos esfor�os da media��o. Tanto assim que n�o se estabeleceu di�logo org�nico, espont�neo entre eles.
C�PULA DA ARTE
As interven��es mais inspiradas vieram do cineasta, para quem o artista "deve se comunicar, mas n�o fazer comunica��o, como faz a televis�o". Ele se definiu como "um fundamentalista da autonomia da obra de arte":
"A autonomia se manifesta antes mesmo que a obra exista. No processo de cria��o, voc� percebe a obra, sente-a vindo. � um jogo, uma c�pula. �s vezes, s� resta acatar o que ela diz. A gente deve satisfa��o a ela, n�o ao p�blico".
Ele contou que, durante a prepara��o de seu primeiro longa-metragem documental, "Preto e Branco" (2004), sobre a quest�o racial, buscava obstinadamente um personagem racista. Depois de procura exaustiva, encontrou um cego que tinha horror a asi�ticos. O pai dele se chamava Hitler de Lima, e a fam�lia morava numa certa rua Estado de Israel.
"Se fosse [um filme de] fic��o, e houvesse um roteirista, ele seria demitido sumariamente", brincou Nader.
Tamb�m professora universit�ria e ensa�sta de destaque (uma antologia de seus textos acaba de ser publicada em portugu�s sob o t�tulo de "A M�quina Pinochet"), Eltit comparou dois momentos de sua carreira nas letras. Quando assinou seu primeiro romance, nos anos 1980, a ditadura ainda vigorava no pa�s. "Havia no Chile um bur� de censura que determinava a possibilidade de publica��o das obras. Mas nunca escrevi para o censor", disse.
J� na d�cada seguinte, quando passou uma temporada no M�xico (onde servia como adida cultural de seu pa�s), ela afirma ter descoberto uma "forma menos vis�vel de ditadura, o mercado, no qual o objeto, transformado em espet�culo, valia mais do que o sujeito". Buscou ent�o trabalhar esse estado de coisas com as ferramentas da literatura.
Eltit disse que uma das quest�es que a movem hoje � a da igualdade entre os g�neros, das assimetrias entre homens e mulheres. "O sistema paga menos a mulheres porque acha que valem menos. E elas internalizam esse pensamento."
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