� complicado se tornar paladinos da liberdade, diz ex-cartunista do Charlie
Fa�a-me rir, doa a quem doer? N�o � bem assim. Na mesa "De Bal�es e Blasf�mias", a terceira deste s�bado (4), na Flip, os cartunistas franceses Plantu e Riad Sattouf mais o brasileiro Rafael Campos Rocha debateram como rabiscos numa folha de papel podem mudar o mundo –para o bem ou para o mal.
Questionado sobre qual seria sua miss�o como desenhista, Rafa brincou: "Irritar o m�ximo de pessoas que puder, e pelo feedback tenho conseguido". Fala-se muito do terrorismo l� fora. Mas, para o autor de "Deus, essa Gostosa" (Quadrinhos na Cia.), o Brasil tamb�m n�o est� de brincadeira. "Somos o Terceiro Reich do �ndio, o Talib� da mulher e a Ku Klux Klan da popula��o negra. � um pa�s violento. Matamos um milh�o assassinados em 20 anos", disse, com "feedback" positivo desta vez: o p�blico o aplaudiu mais de uma vez.
Ex-colaborador do "Charlie Hebdo", alvo de ataque terrorista com saldo de 12 mortos em janeiro, Riad questionou se � justo carregar um peso t�o grande nas costas. "De uma hora para outra, fomos vistos como paladinos da liberdade de express�o, e isso � complicado", disse em entrevista antes do debate. "De repente viramos especialistas em geopol�tica, mas na verdade o cartunista � algu�m muito t�mido, sem muito sucesso sexual com mulheres. N�o tem algu�m mais afastado dessa coragem toda."
Ele disse que o tra�o mais ofensivo que j� fez foi o de sua m�e –deu-lhe "um nariz muito grande, e ela n�o ficou feliz". No premiado "O �rabe do Futuro", o filho de francesa com s�rio retrata sua inf�ncia entre 1978 e 1984, na L�bia de Gaddafi e na S�ria de Assad. O pai, um idealista "de extrema-direita", descartou um posto de professor na Oxford para trabalhar no plano educacional das ditaduras.
Plantu, cartunista pol�tico por excel�ncia, h� tr�s d�cadas assina a charge na primeira p�gina do "Le Monde". Em 2006, criou a ONG Cartooning for Peace (cartunistas pela paz) como resposta � pol�mica provocada por uma charge dinamarquesa na qual aparece o turbante do profeta Maom�.
Para o franc�s, � preciso "prestar mais aten��o hoje" para encontrar a f�rmula de exercer "a liberdade de express�o sem humilhar ningu�m". Plantu mostrou imagens de v�rios colegas, inclusive a foto no hospital do quadrinista s�rio Ali Ferzat. Ele, que j� enfureceu ditadores como Saddam Hussein, Muammar Gaddafi e o conterr�neo Bashar Al-Assad, foi espancado e teve os dedos das m�os quebrados "como aviso".
Mediador do bate-papo e outro grande nome da HQ brasileira, Claudius lembrou que tamb�m no Brasil as coisas podem ficar feias para quem faz gra�a contra poderosos. Appar�cio Torelly, o nobre confessamente fajuto Bar�o de Itarar� (1895-1971), � um bom exemplo. Ele ridicularizava o governo Get�lio Vargas no jornal sat�rico "A Manha".
Certo dia, recebeu a visita dos homens de Filinto Muller, chefe de pol�cia do estadista. "Muller quebrou tudo e bateu nele. No dia seguinte, o bar�o arrumou as coisas e pendurou na porta o cartaz: 'Entre sem bater'", contou Claudius. Os tr�s cartunistas exibiram trabalhos em que deram a cara a tapa.
Colaborador do caderno "Ilustr�ssima", da Folha, Rafa explicou que, em "Deus, essa Gostosa", quis mostrar como � algu�m "tentando levar uma vida de pequena burguesa sendo a divindade m�xima do universo –e gostosa". "Deus costuma ser branco, velho, casto e autorit�rio. Quis fazer um Deus que eu achasse legal. E era uma mulher jovem e negra, invers�o total dos valores."
Para ele, incomodar algu�m faz parte do pacote. "Tem gente burra em todo lugar, n�o � s� na religi�o. Rafa, que em 2010 fez tro�a com o p�blico da Flip ao dizer que estavam tentando "rebaixar os quadrinhos ao n�vel da literatura, exibiu outros trabalhos fortes. Num deles, um garoto v�tima dos atentados terroristas durante a maratona em Boston n�o consegue entrar no c�u. "A fila est� cheia de outras crian�as que morreram em bombardeios americanos."
O canhoto Plantu, que passou o debate deslizando os dedos num tablet para desenhar os colegas (Rafa apareceu com uma aur�ola, e Riad com mais cabelo do que tem), tamb�m trouxe uma s�rie de trabalhos seus. O portif�lio ia de bispos cat�licos com garotinhos a Dominique Strauss-Kahn, ex-n�mero 1 do FMI que caiu ap�s esc�ndalo envolvendo uma camareira e um sexo oral for�ado, cavalgando em um grande p�nis.
Riad contou como foi retratar o pai, um homem "muito educado, mas que queria um golpe de estado e vivia dizendo 'esse a� eu fuzilaria'". N�o quis comentar se a hist�ria de "O �rabe do Futuro" desagradou seu velho. Essas impress�es, disse, estar�o na segunda parte da saga.
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