'Cinema brasileiro tem vergonha do corpo', diz diretor do filme de amor gay 'Tatuagem'
Pernambuco mais uma vez levou um pouco de temperatura ao normalmente frio Festival de Gramado.
Na noite deste domingo (11), o filme "Tatuagem" --mesmo prejudicado pelo atraso na exibi��o, realizada ap�s premia��es para produ��es locais--, mostrou que Hilton Lacerda, roteirista de "O Baile Perfumado" (1997), em estreia na dire��o solo, segue a linha do cinema fora da curva das produ��es comerciais brasileiras, com um roteiro reflexivo, nudez frontal e uma das cenas de sexo entre dois homens mais ousadas dos �ltimos anos.
"Tatuagem" � uma fic��o baseada nas experi�ncias do grupo teatral an�rquico Vivencial Diversiones, que atuou no Recife na d�cada de 1970. Mesmo durante a ditadura, o grupo conseguiu promover shows regados a palavr�es, cr�ticas sociais e nudez no Complexo de Salgadinho, regi�o entre Recife e Olinda.
Lacerda manteve o esp�rito em seu longa, que pode ser, de certa forma, um primo pr�ximo de "A Febre do Rato", escrito pelo pernambucano e dirigido por Cl�udio Assis --que chegou a participar do Vivencial.
N�o por acaso, Irandhir Santos � o protagonista das duas obras. "Os filmes s�o parentes", concorda Lacerda. "Mas com fundamentos diferentes: 'A Febre do Rato' se passa hoje em dia, mas � ligado ao passado para trazer um tempo que n�o existe. J� 'Tatuagem' � uma reflex�o do futuro."
Edison Vara/Pressphoto/Divulga��o | ||
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O diretor e roteirista Hilton Lacerda ao lado do cartaz de seu filme "Tatuagem", exibido no Festival de Gramado 2013 |
Mas a incorpora��o do personagem de Irandhir em "Tatuagem" vai mais al�m e j� parte na frente pelo Kikito em Gramado, que termina no s�bado (17): o ator interpreta Cl�cio, l�der da trupe Ch�o de Estrelas, que se apaixona por um soldado do ex�rcito de 18 anos (Jesu�ta Barbosa).
As cenas de sexo entre os dois s�o de um realismo chocante para quem acha que uma rela��o homossexual existe apenas para criar frases de efeito em novela.
"Essa radicalidade no cinema pernambucano � um reflexo de nossas convic��es narrativas", acredita o cineasta.
"Me incomoda que o cinema brasileiro tenha vergonha do corpo, que foi remodelada a partir dos anos 80. Hoje, voc� conversa com um ator e oferece um papel que exige uma cena de sexo, ele acha que � muito compromisso. Mas se o papel for de um assassino, ele acha normal. Afetividade incomoda."
Hilton Lacerda acerta nesse poss�vel desconforto do espectador. "Tatuagem" � sobre liberdade, e ele pede ao p�blico uma cumplicidade na aceita��o de uma "liberdade" que pode ser diferente da sua.
SEXO E ARTE
O filme usa a rela��o proibida, principalmente em 1978, como guia da trama (at� de forma leve), mas ele � verdadeiramente sobre Cl�cio, com Irandhir encontrando um equil�brio espetacular entre o pai de fam�lia (ele tem um filho de 13 anos) e l�der de um coletivo no qual sexo e arte se misturam sem fronteiras.
Hilton Lacerda discute, portanto, o limite da liberdade e resvala, propositalmente, no que acontece hoje na sociedade. "Vivemos em um estado de tens�o muito grande. Estamos chegando ao �pice de algo que vai se transformar, porque estamos retornando para pontos perigosos, como a intoler�ncia. � impressionante o n�vel da carolice", afirma. "Quando vejo o Papa t�o bonzinho, n�o sei se isso � bom. Talvez seja uma estrat�gia."
Mesmo assim, o roteirista de obras como "Amarelo Manga" (2002) e "�rido Movie" (2005) diz que n�o teve problemas para levantar o or�amento de R$ 2,5 milh�o por meio de editais do governo de Pernambuco. "Me perguntaram se havia mercado para um filme de teor gay. Mas n�o quero enquadr�-lo em um g�nero de sexualidade, como se fosse uma fic��o cient�fica. Adoro festivais de diversidade sexual, mas tem de procurar a sensibilidade em outros lugares", diz ele.
Lacerda se disse incomodado com o atraso da exibi��o de seu filme em Gramado, causado pela premia��o de produ��es locais. "Fiquei chateado, porque metade da sala foi embora, claro", confessa. "Quem recebe pr�mio quer sair em seguida para comemorar. Mas vamos em frente"
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