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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/DUELO NA PLANÍCIE
Jefferson diz ter "medo" de Dirceu e o chama de arrogante; petista acusa adversário de prevaricação por não ter denunciado "mensalão"
"V. Ex.� provoca em mim instintos primitivos"
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BRASÍLIA
DO ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
Na primeira vez em que ficaram
frente a frente desde o início da
maior crise política dos últimos
dez anos, os deputados Roberto
Jefferson (PTB-RJ) e José Dirceu
(PT-SP) trocaram insultos, ironias e acusações, em um duelo de
quase uma hora de duração.
Jefferson e Dirceu contradisseram-se ao menos uma dezena de
vezes, principalmente quanto ao
papel exercido pelo ex-ministro
da Casa Civil no governo.
Enquanto Dirceu, na condição
de depoente no Conselho de Ética
da Câmara, procurou minimizar
sua influência no governo e no PT
-e, por conseguinte, nas relações
com o empresário Marcos Valério
de Souza-, o petebista, mesclando agressividade e ironia, disse
que o petista tinha pleno conhecimento do suposto esquema.
"O José Genoino [ex-presidente
petista] era vice-presidente do PT.
O presidente de fato era o ministro José Dirceu. Tudo o que nós
tratávamos na sede nacional do
PT tinha que ser fechado e homologado depois na Casa Civil pelo
ministro José Dirceu", declarou
Jefferson, sentado a cerca de cinco
metros do ex-ministro.
Ele procurou constranger Dirceu citando diversos acordos políticos e eleitorais entre PTB e PT
que teriam tido a anuência do ex-ministro. "O acordo da Bahia foi
fechado na Casa Civil. O acordo
de Goiás, o acordo de São Paulo, o
acordo do Paraná, que envolvia a
nomeação em Itaipu [empresa
elétrica], foi fechado na Casa Civil", afirmou.
Foi uma acareação informal.
Cada vez que era questionado por
deputados se confirmava alguma
acusação de Jefferson, Dirceu respondia com um sonoro "não". Invariavelmente emendava: "Não é
fato. Não é verdade".
"O deputado Roberto Jefferson
fez muitas acusações. O deputado
teve todas as condições de denunciar o "mensalão". Mas ele quer
transferir a prevaricação que é dele para nós", disse.
Não chegou a haver um debate
direto entre os dois, mas discursos intercalados. Jefferson, após
ouvir quase duas horas de depoimento, finalmente teve chance de
falar às 17h02. Dirigindo-se ao
"povo do Brasil", disse que Dirceu
"treinou" os principais implicados em acusações -Silvio Pereira, Delúbio Soares e Valério.
E carregou no sarcasmo: "Não
tem mensalão no Brasil. É conversa da imprensa, todos os jornais
mentem, todas as revistas mentem. Os gestos do Delúbio não são
do conhecimento dele [Dirceu].
As atividades do Marcos Valério,
que foi 12 vezes à Casa Civil, ele
não viu, não."
E depois, virando-se para as câmeras: "Você, que está em casa,
acredita nisso? A Polícia Federal
não contava para o homem mais
importante do governo. O Coaf
[Conselho de Controle de Atividades Financeiras], que controla
essas movimentações financeiras,
não informou. O general [Jorge]
Felix [Segurança Institucional], o
delegado Mauro Marcelo [ex-diretor-geral da Abin], amigo pessoal dele, não diziam."
Dirceu, irritado, respondeu dizendo que não tinha jurisdição
sobre essas áreas, subordinadas a
outros órgãos do governo. "Por
que o Coaf, a PF, vão me informar
do que estão fazendo? Ele [Jefferson] quer vender a idéia que eu
usurpava funções na Casa Civil."
Jefferson alfinetou por diversas
vezes a perda de poder do ex-ministro, hoje deputado. Chamou-o
de "inocente deputado, humilde
deputado". "Vejo José Dirceu hoje pela primeira vez despido daquela arrogância natural, daquela
empáfia que exibia."
Dirceu rebateu: "O sr. fala da
minha arrogância, mas fala aqui
com satisfação e arrogância. Nunca fui arrogante quando era ministro." Houve risos na platéia de
cerca de 200 pessoas e manifestações de deputados. "Ele já nasceu
arrogante", gritou a deputada Zulaiê Cobra (PSDB-SP). "A senhora não achava isso quando éramos amigos de faculdade", rebateu o petista.
Jefferson também tentou envolver o presidente Luiz Inácio Lula
da Silva, que vinha preservando
até agora. Foi quando mencionou
as negociações para a troca da diretoria da estatal elétrica Furnas,
que Jefferson acusa de fazer uma
"caixinha" para financiar o PT.
Declarou que o assunto era tratado no gabinete do presidente,
com a presença dele.
"Vossa Excelência falseia a verdade no episódio de Furnas. O assunto foi tratado no gabinete do
presidente Lula entre mim, Vossa
Excelência, o ministro Walfrido
[Mares Guia, do Turismo] e o presidente Lula ouvindo."
Em um dos momentos de
maior ironia, Jefferson afirmou
que tinha medo de Dirceu. "Vossa
Excelência amedronta as pessoas.
Eu tenho medo, confesso, porque
Vossa Excelência provoca em
mim os instintos mais primitivos.
Tenho medo, sinceramente, da
consequência dessas provocações." Até Dirceu riu nessa hora.
(FZ, SN, RB e CG)
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