Depoimentos refor�am suspeita da Pol�cia Federal sobre reitor da UFSC
Depoimentos colhidos pela Opera��o Ouvidos Moucos refor�am a suspeita, para a Pol�cia Federal, de que o ent�o reitor da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) Luiz Carlos Cancellier tentou obstruir investiga��es internas e deixou de tomar medidas para coibir defici�ncias na fiscaliza��o da aplica��o dos recursos da universidade.
Cancellier se matou dias ap�s ter sido preso e afastado da universidade, o que gerou manifesta��es e notas de protesto contra a investiga��o.
Os depoimentos tomados pela PF, que revelam um ambiente tenso e cheio de desconfian�a entre diversos professores, ser�o pe�as importantes no primeiro relat�rio parcial do caso, que dever� ser entregue pela pol�cia nos pr�ximos dias ao Judici�rio.
Cancellier n�o ser� indiciado porque a sua morte leva � extin��o da punibilidade –a pol�cia dever� indiciar cerca de uma dezena de outros investigados.
A opera��o investiga supostos desvios de recursos e irregularidades no programa de EaD (Educa��o a Dist�ncia) da UFSC, financiado pela Capes, funda��o vinculada ao Minist�rio da Educa��o.
Fiscaliza��es da CGU (Controladoria Geral da Uni�o) apontaram bolsas de tutoria "concedidas a pessoas sem qualquer v�nculo com as atividades de magist�rio superior, inclusive parentes de docentes que integravam o programa" e "direcionamento de licita��es, com uso de empresas de fachada, para produ��o de falsas cota��es de pre�os de servi�os, em especial loca��o de ve�culos".
Surgiram casos de professores "coagidos a repassar metade dos valores das bolsas" para outros professores. Uma auditoria da Capes apontou irregularidades como duplicidade de pagamentos e uso de verba de custeio para bolsas –total de R$ 372 mil em "gastos indevidos".
Em uma manifesta��o in�dita de novembro passado que integra a investiga��o, a procuradora da Rep�blica Daniele Cardoso Escobar apontou que a fiscaliza��o da CGU "constatou o descontrole pela universidade na gest�o dos recursos p�blicos voltados para os cursos" do EaD, "o que propiciou por anos e anos situa��es de desvio de verbas p�blicas".
A procuradora escreveu que dois pareceres da pr�pria procuradoria federal vinculada � UFSC, de 2013 e 2014, j� haviam recomendado maior rigor no uso dos recursos, por�m "a UFSC continuou com o descontrole na gest�o dos recursos p�blicos dos cursos de EaD, tratando com desleixo o dinheiro p�blico".
A Procuradoria havia concordado com o pedido de pris�o tempor�ria de Cancellier e outros seis professores da UFSC, revogada um dia depois pela Justi�a Federal.
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Campos da Universidade Federal de Santa Catarina; institui��o � alvo de opera��o da Pol�cia Federal |
INQU�RITO
Desde que a opera��o foi deflagrada, em setembro, a PF analisou mensagens de aplicativos de celular, e-mails e documentos apreendidos e ouviu em inqu�rito sob sigilo cerca de cem pessoas.
Professores narraram que Cancellier se mostrou particularmente incomodado com as investiga��es do corregedor da UFSC, Rodolfo Hickel Prado, e com uma professora, Ta�sa Dias, que como coordenadora do EaD de administra��o tomou contato com irregularidades no programa e passou a cobrar uma posi��o da dire��o da UFSC. O reitor chegou a "avocar", ou atrair para a reitoria, uma sindic�ncia da corregedoria que apurava as irregularidades.
A antecessora de Cancellier na Reitoria, Roselane Neckel, que dirigiu a UFSC de 2012 a 2016, fez � pol�cia um longo relato sobre as medidas que teria tomado para melhor fiscalizar a gest�o dos recursos p�blicos na UFSC, mas pelo menos uma delas teria sido desfeita na gest�o de Cancellier.
Criada por Roselane em 2014, a Contadoria foi extinta em agosto de 2016 pela pr�-reitoria de administra��o, durante a gest�o de Cancellier. Um dos principais pap�is da Contadoria era averiguar a presta��o de contas das funda��es. Com a extin��o do �rg�o, as presta��es das funda��es voltaram a ser analisadas pelo Conselho de Curadores, formado por professores.
Um dos �ltimos levantamentos divulgados pela Contadoria mostra que 93% de 407 projetos que receberam recursos p�blicos estavam "aguardando an�lise".
Segundo a ex-reitora, a rela��o da Contadoria com as funda��es "continuou muito dif�cil e, mesmo com a desconfian�a da perman�ncia das defici�ncias nas presta��es de contas, estas acabavam sendo aprovadas no Conselho" de Curadores.
Em depoimento, a professora Evelize Welzel, 42, coordenadora do curso de administra��o, disse que o reitor comentou certa vez que o corregedor era "maluco" e que, "se ele continuasse ali, todos estariam 'ferrados'".
O reitor estava "muito contrariado" com um e-mail que Ta�sa enviara a diversos integrantes do comando da institui��o para alertar sobre as supostas irregularidades no EaD. Em virtude dos movimentos de Ta�sa, Cancellier "insistiu" com Evelize que "Ta�sa deveria sair do cargo de coordenadora do EaD".
UNIVERSIDADE NEGA
A UFSC afirmou � Folha, em nota, que desde que Luiz Carlos Cancellier assumiu a reitoria, em maio de 2016, a presta��o de contas do programa UAB (Universidade Aberta do Brasil) "n�o foi objeto de quaisquer recomenda��es dos �rg�os de controle".
A nota, assinada pelo professor �ureo Moraes, chefe de gabinete e ex-bra�o direito de Cancellier, critica a atua��o do corregedor, Rodolfo Hickel Prado. Ap�s a morte de Cancellier, Moraes chegou a assinar uma portaria que levou ao afastamento do corregedor, mas o ato foi revogado pela reitora em exerc�cio.
"A atua��o do corregedor foi resultante do desconhecimento, desrespeito e desprezo dele pela universidade. Algu�m que n�o conhecia a institui��o, que atuava por meio de amea�as e intimida��o e de modo absolutamente arbitr�rio", diz a nota, que sustenta n�o ter havido ampla defesa na apura��o interna.
"[O corregedor] encaminhou �s inst�ncias externas relatos parciais e seletivos. Uma atitude precipitada e leviana, para dizer o m�nimo", afirma o texto. Sobre a extin��o da Contadoria, a nota da UFSC argumentou que, a rigor, o �rg�o "nunca existiu na estrutura" da universidade, e o que o trabalho executado pelos servidores era "refeito" no Conselho de Curadores.
Prado, hoje afastado da corregedoria por recomenda��o m�dica, disse � Folha, antes da nota da UFSC, que ao cumprir seu papel incomodou um grupo "de meia d�zia" de professores que "confunde autonomia com soberania". "O que h� de irregularidades em universidades � uma coisa sem precedentes."
� PF docentes da UFSC disseram que o uso de verbas de custeio para pagamento de bolsas era pr�tica comum e n�o veem irregularidade. Uma das suspeitas da PF � que parte das bolsas servia apenas para engordar pagamentos a professores, sem a devida presta��o do servi�o.
O professor M�rcio Santos, da UAB, disse � PF que o pagamento de bolsas com verbas de custeio "� uma pr�tica que sempre foi permitida pela Capes" e que "possui planilhas que demonstram" isso. "N�o se trata de complemento salarial e sim de pagamento por servi�os prestados na atividade contratada."
O professor Rog�rio Nunes, que coordenou at� 2016 o curso de gradua��o a dist�ncia em administra��o, disse � PF que "entende que [tal pr�tica] n�o consiste em ilegalidade". Ele "confirma que as bolsas estavam funcionando como complemento salarial para diversas pessoas, mas que isso se devia ao servi�o efetivamente prestado".
Ao depor, o presidente da Capes, Ab�lio Afonso Baeta Neves, disse que "havia todo interesse em dar os meios necess�rios para que a Corregedoria da UFSC aprofundasse sua investiga��o", mas que teve dificuldades para acessar o que estava sendo apurado.
CRONOLOGIA
30.Janeiro.2014
> Canal eletr�nico do Minist�rio P�blico Federal recebe den�ncia sobre irregularidades na aplica��o de recursos federais recebidos pela UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) sobre o curso de ensino � dist�ncia de F�sica
> MPF aciona a CGU (Controladoria Geral da Uni�o)
17.Fevereiro.2016
> CGU envia ao Minist�rio P�blico Federal de SC relat�rio sobre apura��es nos anos de 2014 e 2015
> Relat�rio aponta, entre outros itens, descontrole e aus�ncia de sistema de gest�o e fiscaliza��o do contrato, o que teria permitido "que desvio de recursos viessem ocorrendo ao longo dos anos"
10.Maio.2016
> O professor Luis Carlos Cancellier de Olivo toma posse como reitor da UFSC
Maio.2016
> Prevista desde 2014 e sob press�o da CGU, a Corregedoria da UFSC � criada. Toma posse o professor Rodolfo Hickel do Prado
> Corregedor afirma que passou a ter suas atividades "dificultadas pela atual gest�o da reitoria"
Julho.2016
> O corregedor foi avisado por telefone por uma pr�-reitora que por ordem do reitor seria exonerado da fun��o comissionada CD3 e seria nomeado em fun��o FG1, "que correspondia a quase 10% do valor da fun��o original". Caiu de CD3 para CD4, uma perda de cerca de 30% do valor original.
09.Agosto.2016
> Pol�cia Federal abre inqu�rito, acionada por of�cio do MPF
Novembro.2016
> Professora Ta�sa Dias se re�ne com o reitor Cancellier e comunica uma s�rie de problemas nas bolsas
Janeiro.2017
> Corregedoria recebe den�ncia an�nima sobre "poss�veis desvios na �rea de ensino � dist�ncia no curso de Administra��o". Prado abre um procedimento
20.Janeiro.2017
> Corregedor da UFSC, Rodolfo Rickel do Prado, chama a professora Ta�sa Dias para obter esclarecimentos sobre a situa��o das bolsas
> Corregedor diz que o reitor pediu pessoalmente "que n�o levasse adiante a apura��o em quest�o"
24.Mar�o.2017
> Ta�sa Dias manda e-mail para o reitor Cancellier e outros, incluindo o corregedor, "para que, ciente desde novembro dos fatos que envolvem o curso, tenha refor�ada a gravidade em que a quest�o do mesmo se encontra apesar de todos os esfor�os dessa coordena��o para que isso n�o atinja mais aos alunos, servidores e professores envolvidos."
04.Maio.2017
> O corregedor se re�ne com representantes da Capes, em Bras�lia, e solicita uma s�rie de esclarecimentos.
> Na volta do reitor, o corregedor � informado que ele queria ter vista dos autos.
24.Maio.2017
> Em memorando, Gabinete do Reitor pede acesso � investiga��o preliminar de car�ter sigiloso que tramitava na Corregedoria. O corregedor se nega a dar acesso � �ntegra
25.Maio.2017
> O reitor viaja para reuni�o na Capes com o presidente, Ab�lio Baeta Neves
> A Capes anuncia a libera��o de mais dinheiro para o programa de estudo � dist�ncia
> O corregedor novamente � cobrado por diversos membros da dire��o da UFSC sobre acesso aos documentos
> O corregedor decide procurar "os �rg�os de persecu��o penal e formalizar a not�cia das apura��es"
14.Julho.2017
> Por of�cio, Cancellier decide avocar o procedimento na Corregedoria. Ele alega que "o seu chefe de gabinete, �ureo Mafra de Moraes, teria 'compet�ncia concorrente' com a Corregedoria-geral para instaura��o de sindic�ncias, realiza��o de investiga��es preliminares e realiza��o de processos administrativos disciplinares"
19.Julho.2017
> Em carta � PF, o corregedor da UFSC informa sobre as press�es que vem sofrendo e diz que o reitor tamb�m � "alvo das investiga��es, uma vez que citado o seu nome como suposto benefici�rio no pagamento de bolsas e outras irregularidades"
14.Setembro.2017
>A PF deflagra a Opera��o Ouvidos Moucos e pede a pris�o tempor�ria por cinco dias de sete professores, incluindo Cancellier, e o afastamento cautelar do exerc�cio do cargo/fun��o p�blica de seis professores
02.Outubro.2017
> O reitor morre ap�s cair em v�o de shopping em Florian�polis. Familiares e amigos apontam suic�dio. Seu advogado disse que foi um achado um bilhete: "A minha morte foi decretada quando fui banido da universidade"
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