Jornalista, escritor e diretor de cinema cubano. � autor de 19 livros, incluindo "O Homem que Amava os Cachorros" . Mora em Havana.
Romaria
Meu primeiro encontro com Mario Vargas Llosa aconteceu no aeroporto de Barajas, em Madri, durante uma escala que minha esposa e eu faz�amos numa viagem � Fran�a e que o ent�o futuro Pr�mio Nobel e sua esposa realizavam rumo a um destino que nunca conheci. Ao v�-lo e reconhec�-lo, naquele dia me atrevi a fazer algo que violenta meu car�ter, mas que n�o pude deixar de fazer nessa ocasi�o: me aproximei e falei com ele.
Ao ouvir minhas primeiras palavras ("Mestre, me desculpe incomodar, mas sou um escritor cubano e queria lhe dizer uma coisa..."), Vargas Llosa p�s a cara inexpressiva que � f�cil imaginar. Quantos escritores j� n�o o teriam abordado ao longo de 50 anos para lhe dizer que tamb�m eram escritores e o admiravam?
Mas o rosto do peruano teve uma mudan�a muscular not�vel quando fui adiante com minha confiss�o ("...e � que cada vez que come�o a escrever um romance, leio seu livro 'Conversa na Catedral'..."), porque n�o h� escritor no mundo que possa resistir inc�lume ao elogio de um disc�pulo, e ainda mais se � dessa categoria.
Nossa conversa, que se animou depois de minha confiss�o, derivou depois disso para o estado de sa�de de velhos amigos cubanos de Vargas Llosa e terminou em poucos minutos, quando nossos caminhos se bifurcaram em dire��o a port�es de embarque diferentes do aeroporto madrilenho.
Agora acabo de viajar a Lima pela primeira vez na vida. N�o sei por que, depois de ter estado em 30 pa�ses, a capital peruana se mantinha esquiva, at� esta ocasi�o em que fui convidado a participar de um encontro de escritores... pelo qual Vargas Llosa passou rapidamente no dia anterior � minha chegada.
Mas o que continuava ali, � minha espera, e que eu n�o podia deixar de ver, era (�) a avenida Tacna, que o escritor menciona na primeira e memor�vel p�gina de "Conversa na Catedral", essas linhas que h� anos sou capaz de citar de mem�ria e que at� reproduzi em uma de minhas obras: "Da porta da 'La Cr�nica', Santiago olha a avenida Tacna sem amor: autom�veis, edif�cios irregulares e desbotados, esqueletos de an�ncios luminosos flutuando na neblina, o meio-dia cinzento. Em que momento o Peru tinha se fodido?"
Dizem alguns limenhos que a avenida Tacna que o personagem de Santiago viu nos anos 1960 j� n�o se parece muito com a atual. Outros afirmam que, embora Lima seja outra cidade, doente de gigantismo, essa rua que margeia o centro hist�rico da antiga capital vice-real apenas mudou: suas quatro pistas continuam a se prolongar por poucas quadras e v�o dar no rio R�mac depois de deixar para tr�s a igreja dedicada a Santa Rosa de Lima.
E, como sempre, est�o abarrotadas de autom�veis e ladeadas por esses edif�cios irregulares, talvez hoje mais desbotados, banhados pela eterna neblina que a cidade recebe do mar e sob o c�u que, por vezes, n�o est� cinzento. A avenida Tacna � qual eu fui, como um peregrino, sobrevive na realidade e se imortalizou gra�as ao poder da grande literatura.
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