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Por Da Redação


Editorial Glamour Berbere, da edição de abril da Vogue, estrelado por Mariana Calazans e edição de moda by Pedro Sales (Foto: Zee Nunes) — Foto: Vogue

No verão passado, batendo papo com uma modelo no fim de uma sessão de fotos para a Vogue inglesa, fiz uma pergunta inocente sobre quais produtos de beleza ela recomendava. Passamos alguns minutos debatendo os méritos de vários corretivos para os olhos, até que ela se inclinou em minha direção de modo conspiratório: “Mas você quer saber o segredo de verdade? Ayahuasca, querida!”. Ela mal concluiu a frase, e senti a atmosfera mudar. Ouvi um murmúrio geral de confirmação; cabeças acenaram de modo respeitoso. “Esse negócio é incrível...”, entusiasmou-se um assistente de câmera com barba moderninha. “Uma sessão equivale a nove anos de psicanálise. Você expurga tudo do corpo, luta contra seus demônios, sai com vários insights sobre sua vida.” E isso tudo, aparentemente, deixa a pele radiante.

Seis meses atrás, eu não sabia nada sobre essa tal erva sagrada – e em geral ilegal –, usada há milênios por tribos indígenas como chave para o subconsciente e remédio para a alma. Pensando bem, tampouco sabia muito sobre tribos indígenas. E quase nada sobre a alma. Minha vida tem sido guiada pelas torres gêmeas da minha fé: ateísmo e mania por controle. Nunca procurei uma resposta em meu subconsciente. Nem busquei a sabedoria em horóscopos, cartas de tarô, curandeiro reiki ou guru de lifestyle. Eu acredito no Google e faço pilates porque é uma alternativa à ioga que não me obriga a cantar mantras nem citar divindades. Acredito na força da mente racional. E em fazer listas.

Editorial Glamour Berbere, da edição de abril da Vogue, estrelado por Mariana Calazans e edição de moda by Pedro Sales (Foto: Zee Nunes) — Foto: Vogue

Mas algo estava acontecendo. De repente, todo mundo que eu encontrava estava buscando as mãos curativas de algum guru ou as benesses de uma terapia alternativa, de preferência espiritual. Uma amiga me recomendou seu acupunturista xamânico; outra estava prestes a embarcar em um workshop de meditação com tambores que duraria três dias, numa tenda no interior da Inglaterra. Isso sem falar no bando de jovens inteligentes e elegantes que estava de partida para o deserto de Nevada, onde acontece o festival de experimentalismo artístico, autoconfiança e autoexpressão conhecido como Burning Man. Um amigo passou o fim de semana inteiro numa fila para abraçar um guru forasteiro, que havia voado do lugar mais remoto da selva amazônica até um gigante centro de convenções em Londres. E, sim, todos haviam ouvido falar da ayahuasca.

Os desfiles do último verão europeu também parecem ter passado por um despertar espiritual. No de Junya Watanabe, modelos trajando roupas franjadas evocavam um apocalipse folclórico, como as henchwomen de Mad Max, com tranças em espiral no topo da cabeça. Na Givenchy, com performance ao vivo dos tradicionais tambores sabar senegaleses, Riccardo Tisci apresentou deslumbrantes vestidos longos poliglotas que incorporavam tradicionais técnicas africanas, indianas e japonesas, arrematados por brilhantes máscaras de safira. As “modelos” de Rick Owens formavam uma poderosa tribo de step dancers vestidas de couro, cujas hipnóticas batidas de pé pareciam chacoalhar até o centro da Terra. “Dizer algo novo, algo pessoal”, anunciou Sarah Burton sobre sua interpretação couture dos figurinos tribais do desfile de Alexander Mc Queen, com pedraria pesada e vestidos cerimoniais. “Quis me reconectar com as coisas que adoro no design de roupas, e mostrar isso a partir de uma visão nova”, ela explicou posteriormente.

Reconectar: eis aí o verbo descolado desta década. É irônico, talvez, que no meio de uma revolução tecnológica em que podemos nos comunicar com milhões de pessoas com o arrastar de um dedo, essa necessidade de conexão de repente pareça tão urgente. Há claramente um desejo coletivo devoltar aos princípios básicos... Será que estamos todos à procura de um xamã? “Sim, as pessoas estão buscando uma maneira de se conectar a uma parte delas que não é puramente racional, um lado mais energético, espiritual mesmo”, defende Wendy Mandy, acupunturista, conselheira, homeopata e praticante de xamanismo. Wendy me fez jurar que não revelaria sua lista de clientes-celebridades, mas quase entrou em êxtase quando lhe pedi que descrevesse seu trabalho – ao contrário do que eu imaginava, ela não recorre a remédios à base de plantas alucinógenas, e sim a um inocente chocalho.

Muitos de seus clientes são jovens adultos, com idades entre 21 e 28 anos. “Acho que esse interesse repentino por práticas como o xamanismo tem a ver com o fato de que as pessoas – principalmente os jovens – querem passar por uma experiência real”, diz. “Eles precisam de ajuda para aprender a ficar parados, a respirar, meditar, fazer ioga; todas essas técnicas que facilitam a volta para o centro, mantendo o foco mesmo quando tudo ao seu redor se move. Outra coisa que buscam é conexão com a natureza. Adoram ir a festivais de música porque podem dormir no chão e ficar ao ar livre. E querem desesperadamente fazer parte de uma comunidade.” (JO ELLISON)

Este é apenas um trecho da matéria Elo Perdido. Leia o texto na íntegra na edição de abril da Vogue Brasil (nas bancas a partir do dia 28.03).

(Foto: Zee Nunes) — Foto: Vogue

O desfile do verão 2014 da Valentino, que deu o tom deste editorial; abaixo, a coreografia tribal de Rick Owens; uma cerimônia amazônica de ayahuasca; e Machu Picchu, no Peru (Foto: Márcio Madeira, IMax Tree, Getty Images, Corbis/Latin Stock e Divulgação) — Foto: Vogue

Os looks do verão de Junya Watanabe e Givenchy; e, abaixo, o festival de autoexpressão Burning Man, que acontece num deserto em nevada (Foto: Márcio Madeira, IMax Tree, Getty Images, Corbis/Latin Stock e Divulgação) — Foto: Vogue

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