A Fama

Brasil s� perde para os EUA em tempo de visualiza��o de v�deos on-line

Eduardo Anizelli/Folhapress
Pedro Henrique C�rtes, no seu quarto, no Itaim Paulista

DANIELA PINT�O
DA EDITORIA DE TREINAMENTO

A cada minuto s�o geradas 500 novas horas de conte�do no YouTube mundial. N�o se sabe quanto dessa produ��o � brasileira. O Google, dono da plataforma, n�o divulga dados regionais, mas informa que o pa�s ocupa o segundo lugar mundial em tempo de visualiza��o de v�deos on-line, atr�s apenas dos EUA.

Chamados de criadores pelo YouTube e de influenciadores digitais pelo mercado (que inclui tamb�m instagramers, facebookers e afins), os produtores de conte�do digital cresceram em n�mero e fama; muitos ganharam status de celebridade.

O fen�meno ganhou for�a por aqui h� tr�s anos, e sua curva continua ascendente. Segundo a Rede Snack, rede multiplataforma de canais reconhecida e homologada pelo YouTube, h� cerca de 310 mil canais de v�deo on-line no pa�s.

O Google n�o confirma o n�mero, mas parece n�o haver d�vida de que o Brasil � pe�a importante desse tabuleiro. Na lista dos 100 canais mais influentes do mundo, 24 s�o brasileiros, segundo o ranking de outubro (�ltimo dado dispon�vel) da Snack Intelligence/Tubular Labs. No ranking dos que mais faturam, por�m, as webcelebridades nativas nem aparecem.

O pa�s ocupa tamb�m o segundo e o terceiro lugares na lista, com Whindersson Nunes e Felipe Neto. No topo das duas listas, reina o gamer e comediante PewDiePie, sueco que se apresenta em ingl�s e faturou US$ 15 milh�es em 2016.

Whindersson, piauiense de 21 anos, ultrapassou neste ano o Porta dos Fundos em n�mero de seguidores; seu canal tem mais de 14,7 milh�es de inscritos e mais de 1 bilh�o de visualiza��es.

Os canais de humor s�o populares, mas outros tipos de conte�do que n�o costumam ocupar a programa��o da TV tamb�m ganharam espa�o. O Manual do Mundo, sobre ci�ncia, experimentos e curiosidades, tem mais de 7 milh�es de inscritos e 1,2 bilh�o de visualiza��es. O canal de game RezendeEvil, voltado principalmente ao jogo Minecraft, tem mais de 9 milh�es de seguidores e superou os 3 bilh�es de visualiza��es (leia perfis).

Um dos fatores respons�veis pelo sucesso � a populariza��o dos smartphones, que j� respondem por mais da metade (55%) das horas dedicadas a v�deos na internet, conforme pesquisa encomendada pelo YouTube.

O mesmo estudo revela que o tempo m�dio gasto com essa atividade duplicou no Brasil nos �ltimos dois anos, saltando de 8 horas/semana para 16 horas/semana. O percentual de brasileiros que passa mais tempo vendo v�deos on-line do que em outras m�dias saltou de 12% para 30%.

O levantamento, de julho, ouviu 1.500 brasileiros entre 14 e 55 anos que assistem regularmente � televis�o. A amostra representa 61% da popula��o brasileira, com margem de erro de dois pontos percentuais.

Outro fator importante � o modo de funcionamento da plataforma. "Como o YouTube oferece uma enorme variedade de canais e conte�do, o espectador n�o fica preso � programa��o fechada e aos hor�rios que a TV imp�e. Ele pode assistir quando for mais conveniente e a partir de diferentes dispositivos", afirma F�bio Utumi, 48, s�cio-diretor da IQ Agenciamento, pioneira no gerenciamento de carreira de youtubers no pa�s. � a mesma l�gica que faz, por exemplo, o sucesso do Netflix.

OUTROS MUNDOS

Os n�meros expressivos ajudaram a catapultar os influenciadores al�m das fronteiras do mundo digital: eles produzem e encenam pe�as de teatro e shows de stand-up, fazem filmes, lan�am livros e licenciam produtos como caderno, camiseta, capa de celular e at� dois �lbuns de figurinhas.

Um desses �lbuns, parceria da Panini (a maior empresa do ramo de figurinhas no mundo) e da ag�ncia brasileira Digital Stars, foi lan�ado em julho deste ano com uma tiragem inicial de 2 milh�es de pacotes de figurinhas. Foi o primeiro do g�nero no mundo.

Al�m de aumentar a exposi��o, s�o essas atividades extras a maior fonte de renda. O ganho com publicidade � mais relevante quando o criador negocia diretamente algum tipo de a��o, seja em eventos seja embutida em seu v�deo (merchandising, por exemplo). Nesses casos, o faturamento � todo dele.

J� as propagandas exibidas antes dos v�deos s�o captadas pelo Google, e o criador recebe centavos de d�lar por exibi��o. O valor � vari�vel e depende de crit�rios que a empresa n�o revela (veja infogr�fico nesta p�gina), mas a soma s� � significativa para os muito famosos. O youtuber recebe quando acumula um m�nimo de US$ 100. Caso n�o alcance o montante em um m�s, os centavos v�o sendo somados at� atingir a cifra.

ONIPRESENTES

Ainda que se dediquem mais a uma determinada rede social, os criadores costumam estar presentes em todas. Os f�s acompanham a vida do �dolo em postagens que v�o do frequentemente irrelevante ao absolutamente pessoal.

Em outubro passado, K�fera contou no Snapchat que sua tia estava com c�ncer terminal. Sem maquiagem, chorando, com os olhos inchados e o nariz escorrendo, encarnava duas das caracter�sticas mais prezadas pelos seguidores: ser "aut�ntico e verdadeiro".

Em junho, PC Siqueira, um dos pioneiros no pa�s, gravou v�deo mostrando o resultado da cirurgia que lhe corrigiu o estrabismo, at� ent�o sua marca registrada; contou que havia sofrido bullying a vida inteira, que estava se sentindo mais bonito e com a autoestima mais alta ap�s a mudan�a. Teve mais de 2,5 milh�es de visualiza��es.

A exposi��o da vida particular e de sentimentos universais aproxima f�s e �dolos, criando a percep��o de "gente como a gente". A suposta horizontaliza��o tamb�m alimenta o anseio de que qualquer um pode ser como eles. Em princ�pio, n�o � necess�rio mais que um smartphone e acesso � internet para ter um canal, e os pr�prios criadores estimulam seus seguidores a produzir conte�do.

S�o poucos, no entanto, que atingem os patamares mais altos. PC Siqueira afirma que a primeira gera��o de youtubers era muito experimental e se arriscava na plataforma. A segunda, que atualmente faz sucesso, profissionalizou-se e sabe que existe uma carreira a ser seguida. Quem est� come�ando agora valoriza fama e audi�ncia e acaba deixando a autenticidade de lado e se aproximando da linguagem televisiva, diz.

"O que me amedronta � que as pr�ximas gera��es de youtubers se tornem cada vez mais celebridades, a ponto de a internet promover um novo distanciamento entre f�s e �dolos."