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    Opini�o

    Miss�o termina sem mudar cen�rio socioecon�mico do Haiti

    RICARDO SEITENFUS
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    03/09/2017 02h00

    Treze anos ap�s sua implementa��o, a Miss�o das Na��es Unidas para a estabiliza��o no Haiti (Minustah) encerra suas atividades com um balan�o contradit�rio.

    Em seu �pice, chegou a contar com 12 mil militares e 2.400 policiais. Conservando ao longo de toda a opera��o seu comando militar, o Brasil foi seu maior contribuinte. Assim, em um rod�zio semestral, participaram 37.500 militares (80% do Ex�rcito, 19% da Marinha e 1% da Aeron�utica).

    Danilo Verpa -31.ago.2017/Folhapress
    Militares brasileiros formam na cerim�nia de encerramento da miss�o de paz da ONU no Haiti
    Militares brasileiros formam na cerim�nia de encerramento da miss�o de paz da ONU no Haiti

    Superando o n�mero de militares enviados ao front italiano no ocaso da Segunda Guerra Mundial (26 mil), a participa��o na Opera��o de Paz no Haiti representa o maior deslocamento ao exterior de tropas brasileiras desde a Guerra do Paraguai (1864-1870).

    A Minustah sofreu 186 baixas, sendo mais da metade por ocasi�o do terr�vel terremoto de 12 de janeiro de 2010. A maioria das demais baixas foi provocada por acidentes, suic�dios e enfermidades, sendo raros os soldados mortos em combate. Assim, das 27 v�timas brasileiras, nenhuma o foi em a��o. Como explicar esta situa��o?

    Por uma raz�o singela: ao contr�rio das demais Opera��es de Paz patrocinadas pelas Na��es Unidas, no Haiti n�o havia e n�o h� guerra. Excetuando-se as gangues de Bel-Air e Cit� Soleil —liquidadas em 2006—, durante os 11 anos restantes, os militares da Minustah n�o enfrentaram inimigos.

    Assim se explica tamb�m o ceticismo do primeiro comandante da Minustah (julho de 2004 a setembro de 2005), general Augusto Heleno Ribeiro Pereira, ao declarar em 2010 que, "como exerc�cio militar, a Minustah � excelente; no entanto, como opera��o de paz, ela n�o tem mais sentido".

    Entre 1993 e 2004, a ONU enviou, sem muito sucesso, seis miss�es militares, policiais e civis ao Haiti, com um custo direto total de US$ 417 milh�es.

    Por sua vez, o engajamento da Minustah, embora com escasso sentido, consumiu a astron�mica soma de US$ 7,2 bilh�es. Al�m desses custos diretos, � necess�rio adicionar os gastos n�o cobertos pela ONU e os diferentes programas financiados gra�as � presen�a da Minustah. No que diz respeito somente ao Brasil, alcan�am R$ 2,5 bilh�es.

    Quando agregamos a suposta transfer�ncia de recursos financeiros p�s-terremoto (US$ 5 bilh�es), em nome do Haiti foram gastos, no per�odo da vig�ncia do mandato da Minustah (2004-2017), aproximadamente US$ 15 bilh�es de d�lares, o que faz da ex-p�rola das Antilhas o maior recept�culo de ajuda per capita do mundo.

    Os resultados s�o p�fios, pois a atual situa��o socioecon�mica do povo haitiano � catastr�fica, ainda pior daquela em que se encontrava em 2004.

    A fal�ncia das a��es da comunidade internacional durante este per�odo explica o impressionante fluxo de emigrantes em dire��o aos pa�ses de acolhida tradicional (M�xico, Estados Unidos e Canad�) e, novidade, em dire��o � Am�rica do Sul, especialmente Brasil e Chile.

    No in�cio de 2010, est�vamos preparando uma "sa�da de crise". Logo, ocorre o terremoto. Em outubro do mesmo ano, militares do Nepal a servi�o da Minustah trazem o vibri�o da c�lera, vitimando mais de 10 mil pessoas e infectando 800 mil outras.

    No fim de novembro, desencadeia-se uma crise pol�tico-eleitoral provocada pela Minustah. Esta perde o rumo, e o Brasil e seus aliados latino-americanos deixam de ser protagonistas. Logo o destino do Haiti retorna ao seu leito hist�rico, sob total influ�ncia dos Estados Unidos, Canad� e Fran�a.

    Para sua desgra�a, o Haiti � membro cativo da agenda do Conselho de Seguran�a da ONU. N�o conseguir� deixar de s�-lo, pois � anunciada uma nova miss�o em substitui��o � Minustah.

    Trata-se da Miss�o das Na��es Unidas para o apoio � Justi�a no Haiti (Minujusth), composta por civis e unidades de pol�cia. Portanto, uma vez mais, os verdadeiros desafios socioecon�micos n�o ser�o enfrentados. Prel�dio a novas crises e futuras interven��es militares.

    RICARDO SEITENFUS foi representante especial da OEA no Haiti (2006-2011) e autor do livro "Haiti: Dilemas e Fracassos Internacionais" (editora da Uniju�, 2014)

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