19/07/2012 16h07 - Atualizado em 19/07/2012 18h20

      Chevron poderia ter evitado vazamento, diz relatório da ANP

      Multa será calculada em 30 dias mas não passará de R$ 50 milhões.
      Chevron não compreendeu a geologia local e não fez análise de risco.

      Lilian QuainoDo G1, no Rio

      A ANP divulgou uma foto aérea, feita na segunda-feira (21), da mancha de óleo no Campo do Frade (Foto: Divulgação/ANP)Foto aérea da mancha de óleo no Campo de Frade
      divulgada pela ANP (Foto: Divulgação/ANP)

      O acidente num poço de petróleo da empresa americana Chevron em Campo do Frade, na Bacia de Campos, em novembro de 2011, que resultou no vazamento de 3.700 barris de óleo poderia ter sido evitado se a Chevron tivesse conduzido suas operações com de acordo com a regulamentação da ANP e com seu próprio manual de procedimentos.

      Essa foi a informação dada pela da diretora-geral da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Magda Chambriard, na tarde desta quinta-feira (19) ao apresentar o resumo do relatório das investigações da agência sobre o vazamento. Segundo Magda, a íntegra do relatório será divulgada no site da agência na sexta-feira (20).

      Em nota, a Chevron informou no início da noite desta quinta que "a resposta da empresa ao incidente foi implementada seguindo a lei, os padrões da indústria e em tempo hábil. O plano de emergência da empresa foi executado conforme as leis e os padrões da indústria. O poço foi selado e abandonado com sucesso". A nota diz ainda que a Chevron trabalha com a ANP em relação a todas as questões referentes ao Campo Frade, incluindo o retorno à produção. Na avaliação da Chevron, o volume de óleo vazado é de 2.400 barris. Leia a íntegra da nota ao fim da reportagem.

      Em 30 dias, segundo Magda, será divulgada a multa a ser aplicada à Chevron, que não passará de R$ 50 milhões, que é o limite para o caso. A diretora explicou que nesse prazo será estudada a dosimetria da multa, levando em conta situações como capacidade econômica da empresa, a gravidade do acidente, a reincidência. Como o vazamento ocorrido em março de 2012 ainda está sendo investigado, a empresa ainda não é considerada reincidente.

      Vazamento de 3.700 barris
      Segundo Magda, apesar de o poço estar selado, ainda vazam para o mar cerca de 20 litros por dia, de óleo que ficou retido em rachaduras e fissuras nas rochas. A ANP afirma, porém, que esse óleo faz parte do total de 3.700 barris que vazaram do poço.

      De acordo com a agência, o vazamento da Chevron significou 96% do total dos vazamentos de óleo no Brasil no ano passado.

      A diretora explicou ainda que estuda o pedido da Chevron para voltar a produzir no Campo de Frade, o que, segundo ela, não é inconveniente uma vez que foi a própria empresa que decidiu suspender a produção após um segundo vazamento em março de 2012, que ainda está sendo investigado pela ANP. Ela disse que no próximo dia 27 a ANP divulgará sua decisão. Magda, porém, deixou claro que a Chevron só poderá voltar a perfurar poços no Campo do Frade quando provar que pode evitar erros como o de novembro de 2011.

      Segundo o relatório da ANP, em relação ao acidente a Chevron não foi capaz de compreender a geologia local, apesar de ter 62 campos perfurados lá. Houve ainda uma estimativa incorreta da pressão no poço, criando condições para acidente.

      A empresa não usou os resultados de testes de resistência em rocha em três poços perfurados anteriormente. Se tivesse usado esses dados, diz o relatório da ANP, o projeto onde houve o vazamento teria se mostrado inviável.

      'Chevron levou 2 dias para perceber vazamento'
      Segundo o relatório, se a Chevron tivesse estudado os dados de incerteza de pressão dos poços, o projeto teria que ser alterado. A Chevron não fez análise de risco contrariando a lei brasileira e sua própria gestão de risco.

      Segundo o relatório, as tentativas da Chevron de controlar o vazamento usaram técnicas inadequadas.

      “A Chevron levou dois dias para perceber o vazamento. As pressões anormais, a perda de circulação, e o fato de a Petrobras ter identificado uma mancha entre Campo do Frade e Roncador deveria ter levado a Chevron a perceber o vazamento”, disse Magda.

      A diretora disse que não foi identificada qualquer falha da parte da Transocean, por isso, ela não é responsabilizada no evento.

      A ANP levou oito meses para elaborar o relatório de 68 páginas. Segundo a diretora Magda, esses oito meses não foram dedicados apenas à investigação, mas à elaboração de todo um processo administrativo.

      “Um processo administrativo é uma situação extensa, tem a investigação e o contraditório, com ampla defesa da Chevron”, explicou.

      Magda Chambriard (Foto: Lilian Quaino/G1)Thiago Macedo, procurador-geral da ANP, Magda Chambriard, diretora-geral,e Rafael Moura, superintendente de Segurança Operacional e Meio Ambiente (Foto: Lilian Quaino/G1)

      Cronologia do vazamento
      Em novembro do ano passado, no Campo de Frade, na Bacia de Campos, foi detectado um vazamento num poço da Chevron. Segundo a ANP, vazaram 3.700 barris de petróleo de rachaduras no leito do mar. A agência proibiu a Chevron de continuar perfurando poços no Campo do Frade.

      Em março, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou as empresas Chevron, Transocean e mais 17 pessoas por crime ambiental e dano ao patrimônio público por causa do vazamento de petróleo no Campo de Frade, da Bacia de Campos, em novembro de 2011.

      Também em março, a Chevron identificou um novo vazamento de óleo, localizado em uma fissura de 800 metros. A petroleira pediu então à ANP para suspender toda a produção no Campo do Frade. Mas quatro meses depois a empresa anunciou sua intenção de voltar a produzir e a ANP estuda o pedido, embora a proibição de perfurar novos poços permaneça.

      O relatório preliminar da ANP sobre o vazamento de novembro de 2011, com 25 autuações, foi enviado à Chevron em março para que a empresa pudesse incluir contrapontos. Segundo a diretora-geral da ANP, as multas não terão valores elevados porque a lei que trata de produção e extração de petróleo não tem punições severas.

      “A nossa lei é antiga, está com valores baixos. Tem foco no abastecimento e na revenda. Ela precisa ser revista para trazer o foco na exploração e produção”, defendeu ela recentemente.

      Magda Chambriard disse que a ANP está finalizando um projeto de lei que torna mais rígida a punição de petroleiras responsáveis por vazamentos.

      “As multas da exploração e produção têm que crescer. Defendemos multas que podem chegar a R$ 30 milhões e multas que podem ser agravadas em caso de morte e derramamento. Neste caso queremos que elas possam ser multiplicadas por cinco. Então, nesse caso as multas poderiam chegar a R$ 150 milhões, o que é uma multa compatível ao porte de uma petroleira”, especificou.

      Histórico da Chevron no país
      A petroleira americana Chevron iniciou suas atividades de exploração e produção de óleo e gás na Bacia de Campos em 1997, após a decisão do governo brasileiro de abrir as portas do setor de petróleo para investimentos privados.

      A companhia detém participações em três projetos em águas profundas no Brasil, todos na Bacia de Campos, mas atua como operadora somente no Campo de Frade, onde detém 51,7% de participação. São parceiros da Chevron neste projeto a Petrobras, com 30%, e a Frade Japão Petróleo Limitada (FJPL), com 18,26%.

      O campo de Frade está situado numa lâmina d'água de cerca de 1.128 metros, a aproximadamente 370 quilômetros a Nordeste do Rio de Janeiro. A empresa possui também participação nos campos de Papa-Terra (37,5%) e Maromba (30%). Mas nesses campos não é a operadora.

      A íntegra da nota da Chevron
      A Chevron Brasil está confiante de que sempre atuou de forma diligente e apropriada, de acordo com as melhores práticas da indústria do petróleo, assim como em conformidade com o Plano de Desenvolvimento aprovado pela agência reguladora.

      A resposta da empresa ao incidente foi implementada seguindo a lei, os padrões da indústria e em tempo hábil. O plano de emergência da empresa foi executado conforme as leis e os padrões da indústria. O poço foi selado e abandonado com sucesso. Respeitamos o relacionamento com o Brasil e esperamos ser um parceiro do país no desenvolvimento de seu potencial como uma superpotência energética.

      Estamos trabalhando com a ANP em relação a todas as questões referentes ao Campo Frade, incluindo o retorno à produção.

      Em relação ao relatório divulgado hoje, a empresa esclarece que:

      A Chevron perfurou mais de 62 poços no Campo Frade e realizou 19 perfurações que chegaram até o reservatório N560 com a aprovação completa das agências regulatórias. As melhores práticas foram utilizadas na modelagem do subsolo para estimar a geologia e a pressão. O modelo adotado para o planejamento do poço foi totalmente calibrado de acordo com todos os dados disponíveis.

      A Chevron utilizou corretamente os dados dos poços perfurados no campo para estabelecer os parâmetros para a modelagem do poço, de acordo com as melhores práticas da indústria. Os dados não indicaram que uma pressão menor deveria ter sido considerada.

      O critério da tolerância ao kick utilizado no plano do 9-FR-50DP-RJS foi consistente com as melhores práticas da indústria. Considerando a previsão da margem de pressão no reservatório, o modelo do poço e o peso da lama empregados neste poço cumpriram ou excederam os padrões praticados pela indústria.

      A Chevron possui processos de Gerenciamento de Risco e de Gestão de Mudanças (MOC) que estão em conformidade com a regulamentação da ANP. A empresa tem aplicado estas práticas de forma apropriada incluindo neste poço.

      O assentamento da sapata numa profundidade de +/- 600 metros utilizado no Campo Frade é consistente com outros desenvolvimentos de poços na Bacia de Campos. Foi aprovado pela agência reguladora para este e todos os outros poços de desenvolvimento anteriores.

      Na comparação de seu desempenho na segurança de operações com seus parceiros na indústria, a Chevron é considerada líder na cultura de segurança. A empresa trabalha continuamente para aperfeiçoar exatamente essa cultura de segurança, com o objetivo de atingir sua meta de operações sem incidentes. A segurança e a saúde dos seus empregados, além da proteção ao meio ambiente estão entre as maiores prioridades da empresa.

      Saiba como foi o vazamento de novembro de 2011:

      Arte Vazamento Chevron Rio (Foto: Arte/G1)

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